Page 950 - ANAIS - Ministério Público e a Defesa dos Direitos Fundamentais: Foco na Efetividade
P. 950

delegação legislativa disfarçada deferida por uma "complacência irregular do Poder

                  Legislativo".
                         Conforme lição de Celso Antônio Bandeira de Mello  1015 ,


                                   "Considera-se que há delegação disfarçada e inconstitucional, efetuada fora do procedimento

                                   regular, toda vez que a lei remete ao Executivo a criação das regras que configuram o direito
                                   ou que geram a obrigação, o dever ou a restrição à liberdade. Isto sucede quando fica deferido
                                   ao regulamento definir por si mesmo as condições ou requisitos necessários ao nascimento
                                   de direito material ou ao nascimento da obrigação, dever ou restrição".

                         Quando     o    Poder     Legislativo   autoriza   que    direitos/prerrogativas   e
                  deveres/restrições/obrigações  sejam  disciplinados  por  regulamento,  renunciando  à  sua

                  competência, solapa o princípio da legalidade ("ninguém será obrigado a fazer, ou deixar de
                  fazer alguma coisa senão em virtude de lei") e confere um controverso poder normativo ao

                  órgão administrativo.

                         Dentro de nossa estrutura constitucional de tripartição de poderes, têm-se que as funções
                  típicas de cada um dos poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, são, em regra, indelegáveis.

                  Diz-se "em regra", porque em dois momentos a  Constituição, excepcionalmente, outorga a
                  prerrogativa de legislar ao Executivo: para edição de medidas provisórias (art. 62) e produção

                  de leis delegadas (art. 68). Em relação às leis delegadas, não serão objeto de delegação, dentre

                  outras, matéria reservada a lei complementar. Acrescente-se ainda, que as previsões contidas
                  nos arts. 62 e 68 da CF, são exceções ao princípio da separação dos poderes que implicam duas

                  conclusões: 1- só a Constituição pode prever exceções aos seus princípios, não sendo lícito tal
                  tarefa ao legislador; 2- não é possível interpretar extensivamente as exceções aos princípios

                  constitucionais.
                         Esse  meio  indireto  ("delegação  legislativa"),  aparentemente  lícito,  representa  uma

                  fraude à Constituição. Se o regulamento não pode ser instrumento para regular matéria que por

                  ser legislativa, é insuscetível de delegação, menos ainda poderão fazê-lo atos de estirpe menor,
                  tais  como  instruções,  portarias  ou  resoluções.  Se  o  Chefe  do  Poder  Executivo  não  pode

                  assenhorear-se de funções legislativas nem recebê-las para isso por complacência irregular do
                  Poder Legislativo, menos ainda poderão outros órgãos ou entidades da Administração direta ou

                  indireta 1016 .


                  1015
                     Curso de Direito Administrativo. São Paulo:Malheiros, 2001, p. 324.
                  1016  BRODBEKIER, Bruno. Poder regulamentar da Administração Pública. Rio de Janeiro, Revista de Direito
                  Administrativo,  Jul./Set.  2003,  vol.  233,  p.  148;  DE  MELLO,  Celso  Antônio  Bandeira.  Curso  de  Direito
                  Administrativo. São Paulo:Malheiros, 2001, p. 335.





                                                                                                             947
   945   946   947   948   949   950   951   952   953   954   955