Page 32 - ARCANO XIII | domdiegosilva
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movia-se com leveza, apesar do peso da tristeza e do corpo volumoso. de passagem
        pela cozinha acendeu o fogo e encheu a chaleira, depois saiu para o pátio dos fundos
        – uma floresta de ervas do tamanho de arbustos com cheiro da laranjeira doce da Vó
        Joaquina. – apenas um miado tímido do gato mais velho saudando a dona da casa
        em seu quintal rompeu o silencio respeitoso que os animais guardavam quando
        ela saía por ali. os mesmos diabinhos que perseguiam bolinhas em sua cama e
        saltavam, miavam, latiam e rosnavam no pátio da frente, ali se faziam calados e
        preguiçosos, quase reflexivos, deitados em meio às ervas, guardando o terreiro.


        demorou-se um instante com a mão suspensa sobre um tridente de ferro
        fincado no chão ao pé da porta e depois levou os dedos à fronte, batendo-os
        levemente três vezes. curvou então o tronco ao cruzar o umbral fazendo
        os mesmos dois dedos tocarem a terra batida, movimento repetido no
        tambor solitário a um canto do aposento para logo virar-se ao canto
        oposto, ao qual dedicou um gesto, quase um aceno. então deitou-
        se ao centro do barraco pequeno, com o topo da cabeça voltado
        à mesa de cozinha coberta com uma toalha muito branca
        de renda e linho com pequenas estátuas, velas em pires,
        flores em copos, ervas, fósforos e muitos objetos em cima.


        ficou assim, com peito e cabeça encostados no chão alguns
        instantes, depois virou-se e deitou-se de lado, então de
        outro, sempre mantendo a cabeça no chão. depois
        ajoelhou-se e encostou a testa na borda da mesa
        três vezes e, segurando a toalha com a ponta dos
        dedos das duas mãos, deitou demorado beijo no
        bordado, passando-o pelo rosto suavemente.
        ainda ajoelhada, separou três velas de cores
        diferentes e uma caixa de fósforos e ajeitou
        o corpo mais para o lado para posicioná-
        las em um tipo de prato candelabro
        onde já três outras velas queimavam.
        diante de uma estátua pequena de
        dois meninos vestindo capas. sua
        cabeça cantarolava: “Cosme e
        Damião, a sua casa cheira
        a cravo e rosa e flor de
        laranjeira”, mas sua boca
        repetia  uma  mesma
        outra frase enquanto
        seus dedos gordos
        e ágeis acendiam
        a s v ela s.
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