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INTERNACIONAL


            O proletariado no centro da sociedade pós-corona
                   Com a crise do coronavírus, a imensa maioria da classe trabalhadora faz seus
            primeiros questionamentos, premissas de uma consciência de classe a ser reconstruída.
                   Por que reconstruída? Porque se a classe trabalhadora — com seu núcleo ativo
            no nível da produção e várias outras camadas de trabalhadores assalariados — é ob-
            jetivamente a classe que produz as riquezas e que tem potencial para ser a agente da
            mudança de sistema econômico, ela normalmente não possui consciência disso. Certa-
            mente não depois da ofensiva neoliberal dos anos 1980. A crescente dispersão da classe
            operária e o declínio de sua organização e de sua consciência fizeram com que seu desa-
            parecimento fosse anunciado, em ondas, por diversos ideólogos, inclusive da esquerda:
            o filósofo francês André Gorz, nos anos 80 (Adeus ao proletariado), Michael Hardt e Anto-
            nio Negri, em meados dos anos 90 (Império). Esses obituários enterram em um mesmo
            movimento a classe operária, seus interesses e seu papel na luta pela transformação das
            relações de produção.
                   Esse declínio da consciência de classe, acentuado por uma teorização com so-
            taque de esquerda, provocou um ruído ideológico em que, como nota o casal de soció-
            logos franceses Pinçon-Charlot, “a dominação da classe burguesa aparece como uma ordem
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            natural, ideia amplamente interiorizada pelo povo” .
                   Entretanto, o choque provocado pela pandemia e as lutas que dela decorrem
            podem subverter esse estado das coisas. Como escreveu o secretário sindical belga Ar-
            naud Levêque:
                           Se  os  sindicatos  conseguirem  promover  uma  consciência  coletiva  baseada
                           nesses diferentes ressentimentos individuais, então existirá uma brecha para
                           que renasça uma “consciência de classe” entre os trabalhadores, que poten-
                           cialmente pode reverter essa correlação de forças tão desfavorável para nós
                           nos últimos 40 anos, resultado das políticas neoliberais. [...] Devemos adotar
                           uma estratégia real rapidamente, antes que a brecha aberta pela pandemia
                           se feche, mas que deve também, e sobretudo, se inscrever no longo prazo. Ela
                           deve estar à altura dos desafios da nossa época, nos dar capacidade de resistir
                           às forças reacionárias e ao mesmo tempo nos afirmar e nos mobilizar para a
                           construção de um futuro desejável para todas e todos. [...] Retomar o poder so-
        Revista Princípios      nº 159     JUL.–OUT./2020  de livre da exploração se os trabalhadores não ganharem a consciência (subjetiva) que
                           bre o trabalho e, portanto, sobre o processo de produção de riquezas, sobre seu
                           conteúdo e suas modalidades, é retomar o poder coletivo sobre a sociedade. E
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                           a sociedade somos nós .

                   De fato, a classe trabalhadora não poderá caminhar na direção de uma socieda-


            forma uma classe, compartilhando os mesmos interesses. Que eles tomem consciência
            do lugar fundamental que a classe trabalhadora ocupa na produção e, de forma mais



            18   Disponível em: <www.revuepolitique.be/crise-du-covid-19-monde-du-travail-et-strategie-syndicale>.
               Acesso em: 17 jul. 2020.
     366    17   Disponível em: <https://journals.openedition.org/lectures/15952>. Acesso em: 17 jul. 2020.
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