Page 2 - Homenagem ao desequilíbrio, ao medo e à superação - PÚBLICO
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peso e à gravidade que os fazem deslizar da rampa, como dejectos despejados num
contentor. A 7.ª Sinfonia de Beethoven empresta uma solenidade trágica ao modo
como os corpos escorregam, tentam reerguer-se, vacilam e resvalam, ou se
entreajudam para ensaiar nova subida esforçada. Este poderoso início, um dos pontos
altos da peça, é a imagem de uma humanidade esperançada mas indefesa: seres sós e
desamparados, por vezes cúmplices e solidários, obstinados em sobreviver.
Coreografia: Yoann Bougeois
Em aparente queda livre, a plataforma ameaça abater-se sobre o grupo; ou gira como
um carrossel vertiginoso, e os intérpretes arriscam uma passada estugada em sentido
inverso, como se contrariando a força centrífuga impedissem o inexorável ciclo da
rotação do planeta. Até restar uma mulher, a correr em círculo, saltando
perigosamente sobre os corpos entretanto derrubados no chão. Num colossal
movimento pendular, a plataforma quase abalroa os corpos que se esquivam no
último segundo, como crianças imprudentes num jogo atrevido com um baloiço
gigante, ou a desafiar o vaivém de alterosas ondas oceânicas.
Associar um registo metafórico ao alto risco físico e ao impacto visual, devedores de
um frisson circense depurado, faz de Celui qui Tombe uma fábula existencial. As
sucessivas cenas servem com maior ou menor fluência o temário, mas a sua
legibilidade permite patamares de fruição para públicos e faixas etárias distintos.
As silhuetas dos três homens e mulheres, de calças, camisas e saias casuais
discretamente coloridas, são as de pessoas em trânsito numa cidade qualquer, ou tão
só uma abstracção de seres humanos. O ranger estrepitoso das quedas da plataforma,
como se na iminência de se desconjuntar, produz acréscimos de empolgamento; o
reconhecimento de vozes célebres (Maria Callas, em Casta Diva, de Bellini; ou Frank
Sinatra, My way, a dança a aproximar-se aqui do ilustrativo) facilita a adesão
emotiva. Ocasionalmente, Bourgeois cede à pura acrobacia, os nexos dramatúrgicos
esmorecem e ponderamos a relação entre o aparato performativo e os fins que serve.
O encandear das cenas tende a repetir-se (alternam obscuridade/luz geral a expor
maquinaria de palco, silêncio/estampidos naturais amplificados e música...). Há certa
quebra energética quando, segundos antes do final, os intérpretes pendurados pelos
braços à plataforma se deixam cair, à vez, exaustos e vencidos.
Com a herança da dança e do teatro físico a trazer contenção poética e depuração à
acrobacia e ao léxico sincrético da peça, Bourgeois realiza uma estimulante
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