Page 687 - ANAIS - Ministério Público e a Defesa dos Direitos Fundamentais: Foco na Efetividade
P. 687
Mesmo diante de intensos protestos, o Parlamento Mirim da capital acriana houve por bem
aprovar o polêmico projeto, o que ensejou manifestações oficiais tanto do Ministério Público,
através da Promotoria de Justiça Especializada de Defesa dos Direitos Humanos, da Promotoria
de Justiça Criminal com atribuições no combate à violência doméstica, do Centro de
Atendimento à Vítima – CAV e do Centro de Apoio Operacional às Promotorias e Procuradorias
Criminais, quanto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), através das suas Comissões de
Assuntos Legislativos e da Diversidade Sexual, todas apontando as diversas
inconstitucionalidades e violações frontais às decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal,
em ―caráter vinculante‖ e ―efeito erga omnes‖ sobre o tema, tendo sido o projeto
―integralmente vetado‖ pela Prefeita de Rio Branco, inclusive, seguindo orientação da própria
Procuradoria-Geral do Município em igual sentido, a apontar o extenso rol de
inconstitucionalidades constantes no referido projeto de lei, além das consequências da vigência
de uma lei inconstitucional.
No entanto, mesmo assim, a Câmara Municipal de Rio Branco, em sessão tumultuada,
derrubou o veto do executivo e fez vigorar uma lei multiplamente inconstitucional, provocando,
por tal razão, a propositura de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADI´s, uma pela
Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público e outra pela Ordem dos Advogados do
Brasil, tendo a primeira obtido êxito na suspensão da eficácia cautelar da norma pelo Tribunal
de Justiça do Estado do Acre, e, posteriormente, julgada procedente pelo Tribunal Pleno, na 3ª
Sessão Extraordinária, datada de 05/06/2019 784 .
Assim, como já dito, a presente tese tem como escopo analisar o teor da referida lei
municipal frente aos textos das Constituições Federal e Estadual do Acre – ante a
impossibilidade do controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal frente à
784 EMENTA: CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ESTATUTO DA
FAMÍLIA. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 46/2018. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL.
CONCEITO DE FAMÍLIA. MUNICÍPIO: INCOMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO CIVIL. CONCEITO
RESTRITIVO. INTERPRETAÇÃO CONFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTRARIEDADE.
RESTRIÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. ENSINO RELIGIOSO DE NATUREZA CONFESSIONAL. POSSIBILIDADE.
ORIENTAÇÃO MORAL E SEXUAL NAS ESCOLAS. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO ENSINO PREVISTO NO
ART. 206, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONSELHOS DE FAMÍLIA. COMPOSIÇÃO. REPRESENTANTES DE
RELIGIÕES MAJORITÁRIAS. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA LAICIDADE DO ESTADO. ART. 19, I, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DA
LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 046/2018. 1. A competência para legislar sobre direito de família é privativa da
União, ex vi do art. 22, I, da Constituição Federal, portanto, dotada de inconstitucionalidade formal norma municipal que
apresenta o conceito de família. 2. Não é dado à legislação municipal limitar o conceito de famílias às heteroafetivas e às
monoparentais quando o Supremo Tribunal Federal já conferiu interpretação extensiva, não reducionista a tal conceito,
sobretudo, quando por consequência pode ser imposta a limitação na oferta de políticas públicas em decorrência da classificação
do instituto (ADIN Nº 4.277/DF e ADPF Nº 1.352/RJ). 3. Embora admitido em nosso ordenamento jurídico o ensino religioso
de natureza confessional – ADI nº 4439/DF – os demais conteúdos pedagógicos e sua ministração em sala de aula devem
guardar observância aos princípios do ensino previstos no art. 206, da Constituição Federal. 4. A admissão como membros dos
conselhos da família de representantes das religiões majoritárias em detrimento das minorias viola frontalmente o art. 19, I, da
Constituição Federal, que preconiza o princípio da laicidade do Estado. 5. Procedência do pedido para declarar a
inconstitucionalidade da Lei Complementar Municipal nº 046/2018 (TJAC. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 0800004-
89.2018.8.01.0900. Relatora: Desª. Eva Evangelista. Julgada em 05 de junho de 2019)
684