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Histórias de confinamento

             O confinamento foi um período bastante difícil e complicado para todos nós, pois não havia forma de sermos
          livres sem infringir algum tipo de regra. Em particular, experienciei várias situações que me fizeram amadurecer en-
          quanto pessoa.
             Em março de 2020, quando tudo começou, admito que fiquei contente por saber que ia para casa, pois precisava
          de um descanso tanto ao nível da escola como das amizades. Contudo, não sabia que íamos ficar tanto tempo fe-
          chados em casa sem a liberdade que nos era habitual. Quando acabou, por volta de junho de 2020, fiquei com es-
          perança de que tudo isto ia passar e de que o estado de emergência não ia retornar.
             Mas em janeiro de 2021, os casos voltaram a aumentar e o estado de emergência teve de entrar em vigor nova-
          mente. Confesso que este segundo confinamento foi mais complicado do que o primeiro por diversas razões. Uma
          delas é o facto de que na altura tínhamos acabado de regressar de uma interrupção letiva, o Natal. Esta sequência
          de acontecimentos deixou-me desmotivada, pois estava a atingir o meu pico de produtividade, isto é, cheguei das
          “férias” pronta para trabalhar, mas “cortaram-me o bem pela raiz". Uma outra razão que tornou esta quarentena
          mais difícil foi a saudade: a saudade dos meus amigos, a saudade de socializar, no geral, a saudade da rotina. Na-
          da passava de um ecrã, o que me faz questionar: como é que é possível mantermo-nos próximos das pessoas se
          não há qualquer tipo de interação física? Foi assustador!
             Levantando outro tópico, ao contrário do que muitos acreditam, os testes online nem sempre eram melhores e
          mais tranquilos que os testes presenciais. No meu caso, muitas das vezes, acabava por me stressar mais online do
          que presencialmente, pois ao mesmo tempo que tinha testes, tinha trabalhos, aulas de dança, família, entre muitas
          outras coisas. Houve uma situação específica em que cheguei ao meu limite, o teste de Geografia. Na semana do
          teste, estava cheia de trabalhos para fazer e não estava a conseguir conciliar as tarefas, por isso comecei a ter cri-
          ses de ansiedade várias vezes ao dia, o que me fazia ser menos produtiva. Além disso, via-me sem tempo para dor-
          mir, comer, estar com a minha família e, sobretudo, sem tempo para mim. Ao passo que, presencialmente, consigo
          ver as minhas séries, estar mais com os meus amigos, ler, descansar, usufruir de um tempo só para mim e ao mes-
          mo tempo estudar, online via-me restringida à escola, visto que passava vinte e quatro horas por sete dias da sema-
          na fechada num sótão (o meu local de estudo) a estudar. Com isto, o meu conselho para todos os estudantes é o
          seguinte: coloca-te sempre em primeiro lugar, a tua saúde mental é mais importante que um teste ou um trabalho.
             Para além da escola, a dança foi algo que também acabou por  sair prejudicada. Fez-me confusão ter que dançar
          num espaço mínimo sem as minhas companheiras de palco, sem sentir o calor dentro do estúdio, sem ouvir a pro-
          fessora a gritar connosco para nos calarmos, sem cair e não me magoar. Senti muita falta do físico, da presença, de
          suar e de dançar com vontade e espaço. Lembro-me como se fosse ontem de um dia em que, devido à falta de es-
          paço, me aleijei no pé porque bati contra um armário. Fiquei sem dançar durante três semanas, o que me prejudi-
          cou imenso a todos os níveis. A dança é o meu porto de abrigo, onde me isolo de tudo e de todos e descarrego toda
          a minha raiva e ansiedade, por isso, passar tanto tempo sem poder descontrair foi difícil.
             Em suma, o confinamento não é de todo uma situação fácil, pois limita a nossa liberdade e restringe-nos a quatro
          paredes. Contudo, esta experiência ressignificou a saudade. Aprendemos a valorizar o tempo e a liberdade. Desco-
          brimos o valor e falta que faz um abraço de verdade, o toque físico.
                                                                                    Andreia Moura, n.º 29 | 10.º SE1
                                       Confinada dentro de si mesma


             Margarida, uma jovem portuguesa de dezassete anos, nunca se considerou como alguém individualista e auto-
          centrada, pelo contrário, quem a conhecia sempre dizia que a adolescente era altruísta e estava, constantemente,
          atenta aos outros e ao seu bem-estar, Margarida concordava plenamente.

              A jovem nunca se dava ao trabalho de refletir sobre si mesma e perceber como se sentia física e psicologicamen-
          te, o porquê disto, ninguém sabe muito bem. Ela era tão pouco focada em si que mal se conhecia a si mesma,
          quando lhe perguntavam algo pessoal como de que tipo de músicas gostava ou que coisas a faziam feliz, ela sem-
          pre tinha dificuldade em responder, dizia que gostava das mesmas músicas que os seus amigos e dizia que estes a
          faziam feliz, do resto era tudo uma grande incógnita. De qualquer maneira, Margarida era feliz assim, sem ter qual-
          quer tipo de autoconhecimento, mas quando a pandemia começou, a maneira de viver e de ser da rapariga deu
          uma volta de cento e oitenta graus.

              Para muitos é difícil entender o facto de alguém não se conhecer a si mesmo, afinal nós nunca conseguimos se-
          parar-nos de nós próprios, temos sempre essa companhia “eterna”. Mas, para Margarida, era bastante fácil distanci-
          ar-se de si mesma, ela simplesmente focava toda sua atenção nos seus amigos. A adolescente não gostava de ficar
          sozinha, preferia passar uma grande parte do seu tempo com outros, se os seus amigos mais próximos não estives-
          sem disponíveis, ela tratava de organizar planos com outros menos chegados; desde que não ficasse sozinha e
          sem alguém para a distrair de si mesma, Margarida não se importava com quem se encontrava.

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