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relacionamento. A partir daquele dia, disse o general, deveriam jantar sempre
juntos, sempre às 20h pontualmente e após uma pequena palestra que ele,
general, faria para ambos diariamente.
Para isso seriam esperados todos os dias às 16h, também pontualmente, no
escritório, ali mesmo no Casarão.
E para aquele ser inacreditável em sua soberba, a ideia de uma pequena
palestra era ele falar ininterruptamente durante quatro horas, todos os dias,
desde que Victor e seu irmão apareciam na porta do escritório e se
esgueiravam de má vontade até o sofá no estremo mais afastado possível da
mesa de trabalho do general, até o final sempre solene da palestra quando era
ordenado irem para a sala de jantar e para a segunda parte da sessão de
tortura.
Na totalidade destas tardes cansativas o discurso do general se resumia a
repetição enfadonha da determinação e do dever das forças armadas em
manter a ordem estabelecida, assegurar o direito a propriedade privada, ao
sistema capitalista e a preservação das instituições sagradas da sociedade
ocidental, como o casamento heterossexual e monogâmico, o respeito à
constituição federal, ao estilo de vida ocidental, ao sacramento do casamento
e à sacralidade da família e a prevalência da igreja católica.
Mas havia também algumas revelações importantes e Victor ficou atento a
todas elas.
Foi assim que ele soube que os documentos que o irmão entregou passando
para os agricultores a posse das terras, haviam sido declarados ilegais com
base em direito de transmissão de bens patrimoniais porque violavam
flagrantemente os direitos dos herdeiros, que eram, ele mesmo Victor e os
filhos das três ex-mulheres do seu pai, cada uma com uma criança, meias
irmãs dos dois Gatopardos, com a agravante de serem tais herdeiros
considerados menores de idade e, portanto enquadrados em uma legislação
ainda mais protecionista.