Page 66 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
P. 66
Por conta desta constatação um temor sorrateiro e mal compreendido
inquietava-o ainda mais, fazendo-o suspeitar de alguma deficiência de seu
espírito, irreparável e terrível a torna-lo menos do que humano.
Então vivia avaliando os próprios sentimentos, atento aos pensamentos e às
atitudes de impaciência ou desprezo ou mesmo indiferença pelos outros e se
censurava quanto a sua incapacidade para a compreensão ou a solidariedade,
recriminando-se, exigia de si mesmo ser ao menos justo.
Passou a se policiar rigidamente, reprimindo julgamentos e se forçando a ver
sempre o melhor nas pessoas. Tinha consciência de possuir e deixar
transparecer um certo olhar indulgente que as magoava e humilhava, porque
percebiam neste olhar um desprezo quase visceral. Então se forçou a suprimir
tal olhar e se policiava com rigor quanto a isso.
Mas não demonstrar desprezo era diferente de não senti-lo e ao final de cada
embate íntimo, confrontado por seus pensamentos e sentimentos Victor era
sempre obrigado a reconhecer a simples verdade.
Era-lhe impossível gostar de gente.
Seus semelhantes, além de intimamente maus, egocêntricos, eram chatos,
desinteressantes, afetados, insuportavelmente carentes, reprimidos na sua
autenticidade e irrefreáveis em suas exigências ridículas e necessidades
infantis.
Numa palavra. Insuportáveis.
Reconheceu-se completamente incapaz de gostar das pessoas em geral ou
aturá-las individualmente. Avaliou o grau da impaciência que lhe causavam
e se convenceu de que precisava esconder esse sentimento até de si mesmo
porque sabia que não conseguiria, no percurso de uma vida, redimir-se dele.
Por isso Victor tentava sinceramente levar sua vida sendo o mais justo e
correto possível, alimentando ideais de ajudar a todos. Um dia, pensava ele,