Page 8 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
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Ainda podia senti-las. Mesmo após todos aqueles anos sem elas, preso a terra.
Tal como acontecia aos amputados de vulgares membros humanos que
continuavam com a sensação das partes arrancadas. Sim...! Ele podia senti-
las. Seu peso, sua maciez, o leve farfalhar que faziam ao chocar-se contra o
vento quando ele as abria em toda sua gloriosa enormidade ao se preparar
para a experiência sublime do voo.
Lembrou-se da própria figura. De como deveria parecer infeliz em toda sua
altura magrela, com a penugem eternamente desalinhada na cabeça e com o
fator principal a lhe arruinar a aparência, ...Sem Asas...
Deplorável!
Ele que adorava resumir ideias e sentimentos em apenas uma palavra, só
tinha a dizer isso,...deplorável!
Chegou ao último degrau e se imobilizou uma segunda vez agarrando-se
àquele momento ínfimo como a um milésimo de segundo da salvação
improvável, pois mesmo no instante final, decisivo e fugaz, um resquício de
inteligência e raciocínio lógico lutou por sua integridade.
Olhou para a bela jovem que o acompanhava. Reconheceu-a, não como a uma
igual, porque estava claro que ela era e sempre fora totalmente humana,
jamais tivera asas, nem mesmo asas pequeninas. Mas olhou-a como a alguém
em quem alguma vez havia confiado.
Tentou falar, não conseguiu.
Isabeau, por sua vez, sentindo a parada brusca e a insistência do olhar do tio
avô imobilizou-se também e lhe retribuiu o olhar. Sem jamais conseguir
entender o que realmente estava acontecendo, deu-se conta, no entanto, que
estava assistindo a definitiva transformação de Cesar. Reconheceu toda sua
profunda agonia e sentiu-se gelar.