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A ampla gama de atribuição ministerial não pode encontrar limite em obstáculos
geográficos. O Ministério Público brasileiro está presente em toda a extensão territorial.
Ocorre que, infelizmente, os aspectos estruturais da Administração Pública nem sempre são
condizentes com o necessário para a garantia do direito constitucional à saúde.
Cita-se, exemplificadamente, o caso do Município de Alto Garças/MT. A unidade de
saúde sob responsabilidade do Estado de Mato Grosso que guarnece os cidadãos
altogarcenses dista, aproximadamente, 150 km, localizado no Município de
Rondonópolis/MT (Hospital Regional). Naquele nosocômio laboram os médicos especialistas
vinculados ao SUS no âmbito estadual responsáveis pelo atendimento da demanda municipal
de Alto Garças/MT, encarregados do acompanhamento e da prescrição das terapias
medicamentosas. Tal quadro revela que o cidadão hipervulnerável não possuí acesso imediato,
sequer célere, à comprovação por meio de laudo médico nos moldes ilustrados no recurso
repetitivo debatido. Não se desconhece que a situação caótica permeia os mais diversos
rincões do Brasil.
Com essas particularidades, indaga-se: é proporcional vincular o fornecimento do
medicamento ao lapso temporal necessário para a obtenção do laudo? Qual a forma
processual de conferir celeridade ao quadro?
A resposta encontra chancela no artigo 373 do Código de Processo Civil:
Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do
autor.
§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à
impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à
maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da
prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá
dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
(Grifos acrescidos)
Analisando os requisitos legais para a aplicação do instituto, ecoa na doutrina:
3.4. Requisitos materiais. De acordo com o §1º, a possibilidade de dinamização ocorre quando
uma das partes, acentuadamente em relação à outra, detenha: (a) conhecimento técnicos ou;
(b) informações específicas sobre os fatos ou; (c) maior facilidade em sua demonstração.
Trata-se de dados textuais dotados de grande vagueza, que dependem da atuação doutrinária e
jurisprudencial. O §2º, por sua vez, impõe que a dinamização não gere, em detrimento de
nenhuma das partes, um encargo impossível ou excessivamente difícil. Em outras palavras, a
dinamização não deve ser utilizada quando haja prova diabólica para ambos os litigantes. Em
tais situações, deve ser utilizada a regra de inesclarecibilidade, de modo a analisar qual das
partes assumiu o risco da situação de dúvida insolúvel, sendo esta que deverá se submeter à
decisão desfavorável. 466
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Grifos acrescidos. PEIXOTO, Ravi. Art. 373. In: STRECK, Lenio Luiz; NUNES, Dierle; CUNHA, Leonardo (orgs.).
Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 559.
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