Page 257 - LIVRO - ENCONTRO DE RIO E MAR_160x230mm
P. 257

Capítulo 9

                    A ÁGUA E O SUJEITO ORDINÁRIO: TERRITÓRIOS EM DISPUTA

                       Muitos dos materiais audiovisuais sobre o Rio Doce e a tragédia da
                    “lama da Samarco” encontrados no YouTube são produzidos por sujei-
                    tos externos às comunidades atingidas, ainda que tenham algum tipo de
                    vínculo com elas. São documentaristas (amadores e profissionais), jor-
                    nalistas representando veículos de comunicação, frequentadores e “sim-
                    patizantes” desses espaços. Nota-se, por outro lado, que diversos vídeos
                    “amadores” parecem ter sido produzidos por moradores locais.
                    Dos quatro documentários apresentados neste estudo, pode-se afirmar
                    que três foram produzidos por agentes externos às comunidades. O vídeo
                    A Luta Vencerá a Lama: uma marcha por justiça no Rio Doce é uma exceção,
                    pois foi realizado por integrantes do Movimento dos Atingidos por Barra-
                    gens (MAB). Este também é a única produção que percorre várias cidades.
                    Cada um dos outros três vídeos se dedica a uma localidade específica.

                    Alguns aspectos recorrentes podem ser observados nos materiais analisa-
                    dos. Considerando a dimensão formal, os quatro documentários possuem
                    dispositivos narrativos distintos: o primeiro tem um caráter de urgência e
                    se antecipa à chegada da lama na vila de Regência (ES); o segundo segue
                    o formato de reportagem e se dedica a chamar a atenção para a questão
                    da saúde pública em Colatina (ES); o terceiro tem uma proposta artística
                    que se ancora na memória de sujeitos desterritorializados; e o quarto as-
                    sume a forma de um registro de uma ação coletiva.
                    Por outro lado, nota-se um padrão de produção audiovisual que privilegia a
                    entrevista direta, em geral sem a presença de um mediador em cena. Por ve-
                    zes, a figura do mediador aparece em cena, ouvindo os entrevistados ou falan-
                    do diretamente para a câmera, como em Regência, últimas horas antes da “lama”.
                    As obras, em sua totalidade, reúnem diferentes atores sociais das comu-
                    nidades retratadas, representativos de diversos segmentos sociais (pes-
                    cadores, comerciantes, moradores, autoridades locais, representantes de
                    organizações, visitantes etc.), ressaltando a imagem do nativo, do sujeito
                    “local”, para tentar ressaltar um discurso que endossa a dimensão da tra-
                    gédia, das perdas materiais e simbólicas que os moradores sofreram. Evi-
                    dencia-se, sobretudo, a imagem e a fala do sujeito comum, ordinário, e de
                    como seu cotidiano foi afetado.





                                                   255
   252   253   254   255   256   257   258   259   260   261   262