Page 12 - 7ª Edição - Jornal Notícias da Gandaia
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12 HERÓI LOCAL | MAIO 2019 Notícias da Gandaia
MONTE KAPA
CORRE NA DIREÇÃO CERTA
|Andreia Gama
Conhecido por Pica­Pau Ama­
relo, este bairro no Monte da Ca­ parica é considerado como zona problemática e geralmente refe­ rido não pelos melhores motivos. Hoje queremos contrariar essa tendência, porque existe sempre quem marque pela diferença.
E é essa diferença que vamos encontrar no no 37 da Rua do Moi­ nho, sob a forma de pessoa, um homem de 78 anos, cuja simpatia logo contagia. Jaime Almeida é fundador e presidente de Monte Kapa Escola de Desporto, uma as­ sociação que através da prática de atletismo pretende ocupar os jo­ vens com hábitos saudáveis e afastá­los de alguns comporta­ mentos desviantes e errantes as­ sociados à vida de rua.
Nascido na Ilha de São Vicente no Arquipélago de Cabo Verde, o nosso “herói local” veio para Por­ tugal na adolescência. Viveu em Lisboa, Almada, e desde 1971 fez do Monte da Caparica casa, pri­ meiro na Fomega e actualmente no bairro da Chut ­ Cooperativa Ha­ bitacional União de Trabalhadores.
Eletricista de profissão, desde 1988 adoptou o atletismo como hobbie, e como quem corre por gosto não cansa, foi através dele que encontrou a sua missão. “Quando vim para aqui morar, numa altura em que havia muita gente retornada, eu via as crianças na rua, parece que andavam aban­
donadas, sem segurança, e come­ cei a imaginar como é que as pode­ ria ajudar. Mesmo trabalhando e dormindo pouco, consegui juntar um grupo e nessa altura comecei a pensar na prática do atletismo. Treiná­los apenas na rua não resul­ tava, tinham de participar em al­ guma coisa. Então, com alguns contactos, acabei por representar o Beira Mar Atlético Clube de Al­ mada com as crianças”.
É com base nesta ideia que a 23 de Setembro de 2008 é fundado o Monte Kapa Escola de Desporto por Jaime Almeida e Alberto Chaíca, maratonista português.
No entanto, até aqui chegar, o percurso de Jaime Almeida correu noutras direções, sempre com o objetivo de colmatar certas carên­ cias destes jovens. Esteve três anos no Beira Mar Atlético Clube de Almada, até que optou por re­ presentar um clube de bairro, o Clube Recreativo União Rapo­ sense, no Monte da Caparica, onde foi o impulsionador do atle­ tismo. Esta parceria entre ambos terminou ao fim de 17 anos por di­ vergências, e com a sua saída trouxe também os jovens atletas que treinava para a uma nova casa idealizada por si, o Monte Kapa.
A Santa Casa da Misericórdia de Almada disponibilizou­lhes desde início um pequeno espaço na Rua do Moinho. Aqui na sede, têm ex­ posta a bandeira da associação, re­
cortes de notícias referentes à es­ cola e as fotos que Jaime Almeida exibe com orgulho, de atletas campeões nacionais, alguns com estatuto de alta competição, como Artemísia Sá, de 34 anos, a quem dedica uma prova que se realiza dia 6 de Julho na Pista de Atletismo da Sobreda, o 4o Duatlo Artesímia Sá.
Treinos e competições
O atletismo integra várias moda­ lidades: corrida, marcha, lança­ mentos (dardo, disco, martelo e peso) e saltos (altura, cumpri­ mento, de vara e triplo salto). As corridas de velocidade incluem dis­ tâncias curtas, até aos 400 metros (tiro rápido), e as corrida de meio­ fundo e fundo são modalidades do atletismo que compreendem desde os 800 metros até 10 mil me­ tros, que culmina com a maratona.
Actualmente 60 jovens inte­ gram o Monte Kapa, sendo a maio­ ria raparigas “Elas são mais empenhadas. Neste momento tenho 13 campeões nacionais e apenas dois são rapazes”. E dá como exemplo todos os recordes regionais femininos de lança­ mento do dardo, que foram conse­ guidos sob a sua orientação.
Para além de liderar crianças e jovens, também foi criando cam­ peões de diversos escalões, “os tí­ tulos começaram a aparecer a nível regional e nacional, a ponto
de levar alguns à Seleção Nacio­ nal”. Nesta escola de desporto pode­se começar a treinar a partir dos cinco anos, e quanto mais cedo melhor, “para puxar por eles logo desde pequeninos, se vêm com uma idade já avançada torna­ se mais difícil”.
Já se sabe que a juventude é uma etapa atribulada, por diversas razões, talvez isso justifique a assi­ duidade apenas de metade do grupo. “Há uns que não têm muita vontade, vêm um dia, e depois só voltam ao fim dum mês”. Quando o treinador precisa de se impor, re­ corre ao “castigo”, que consiste em dar voltas à pista ou fazer fle­ xões.
O objectivo do fundador com este projecto é “tirá­los da rua, desviá­los da droga, da prostitui­ ção, do álcool, tabaco, dos maus vícios”. Reconhece que a sua dedi­ cação e esforço tem tido impacto nesse sentido, quer acreditar que o seu trabalho faz diferença, “se fosse pela minha vontade ajudava­ os a todos, mas é claro que isso não acontece, alguns acabam por escolher outros caminhos”.
Durante a semana só não há trei­ nos quarta­feira. Às segundas e sextas­feiras treinam das 18h às 20h na Urbanização Filipa D‘Água, “num recinto muito bom para as corridas, e graças à Câmara Muni­ cipal de Almada que acedeu a um pedido meu, em 2011, temos um recinto para saltos e lançamentos. Ali não treinamos tudo, para isso temos a Pista Municipal da So­ breda”, onde treinam terças e quintas­feiras das 16h30 às 20h.
Os fins de semana são exclusi­ vos para competições que decor­ rem em várias pontos do distrito de Setúbal: na Pista de Atletismo da Sobreda, na pista do Complexo Municipal de Atletismo Carla Sa­ cramento, no Seixal e na pista do Complexo Municipal de Atletismo de Setúbal. Nos eventos competi­ tivos enaltece a camaradagem, “já treinei cerca de 2000 crianças, mas mesmo as que praticam noutros clubes parece que foram meus atletas, têm­me estima e carinho e fico mesmo sensibilizado com isso”.
Apesar dos seus campeões o en­ cherem de orgulho, Jaime Almeida reforça que o que mais valoriza não são os resultados em si, mas o contributo positivo que pode dar à vida destes jovens, pois ao traba­ lhar com eles sente­se de alguma maneira responsável pelo seu fu­ turo.
Para além dos jovens do Monte da Caparica, em maioria, “temos atletas de Almada, de Corroios, vou buscá­los a casa para o treino, e para as competições ainda lhes levo um lanche, patrocinado pela pastelaria Repuxo, em Almada. Todos estão federados e ninguém tem de pagar por isso”.
Apoios
Tal como é preciso pernas para correr, também é preciso financia­ mento para tudo o que esta activi­ dade desportiva envolve.
A Câmara Municipal de Almada apoia o Monte Kapa Escola de Des­ porto com um financiamento de 850 € anuais, aos quais acrescem 500 € da União de Freguesias de Caparica e Trafaria. Até ao ano pas­ sado, a CMA financiava 1000 € anuais e Junta de Freguesia 1000 €, um decréscimo que se fez sentir no seio da associação.
Os equipamentos desportivos também foram adquiridos, há dois anos, com o apoio monetário ce­ dido pela CMA, a mesma entidade que lhes faculta uma viatura pró­ pria. Para o seu fundador, a asso­ ciação não sobrevivia sem estes apoios, mas “também já lhes disse que o que dão anualmente nem chega para o gasóleo. Como até à data tenho de pôr sempre algum do meu bolso, então entendi pedir apoio para a informática à CMA e em Janeiro comprei um computa­ dor para a associação”.
Em Abril passado, reuniu com João Couvaneiro, Vice­presidente e Vereador do Desporto da CMA, a quem “pedi um espaço maior, visto que esta sede é pequena, ele disse que a longo prazo podería­ mos pensar nisso e alertou­me para estarmos atentos às candida­ turas para conseguir outros apoios”.


































































































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