Page 34 - memorias
P. 34
Uma carta para o embaixador Mazullo
Choro contigo.Perdemos um parente querido e valioso. Mas é
vontade de Deus e da natureza que estes corpos mortais sejam
postos de parte quando é chegado o tempo de entrar na
verdadeira vida. Nosso estado aqui na terra é de embrião, de
preparo para a vida.
O homem só nasce completamente quando morre. Porque então
lastimarmos que nasça uma nova criança entre os imortais, que
se acrescente um novo membro à sociedade dos eleitos ? Somos
todos espíritos. Que nos sejam emprestados corpos enquanto
podem proporcionar-nos prazer, assistir-nos na aquisição de
conhecimentos ou na prática do bem é um ato de bondade e
benevolência de Deus. Quando, porém, eles se tomam
imprestáveis e nos propinam em lugar do prazer o sofrimento,
em vez de ajuda estorvos, e não desempenham mais nenhuma
das funções para que foram criados, é igualmente ato de
bondade e benevolência dar-nos um meio de desembaraçar-nos
deles. Esse meio é a morte. Nós mesmos,em alguns casos,
escolhemos prudentemente uma morte parcial. Um membro
aleijado que dói e não pode ser reparado, cortamo-lo. Quem
arranca um dente, separa-se dele voluntariamente, porque sabe
que com ele se vai a dor; e quem abandona o corpo, aparta-se
no m e s m o instante de todas as dores e possibilidades de dores e
enfermidades a que está sujeito.
Nós e o nosso amigo estávamos convidados para uma alegre
partida que durará uma eternidade. Sua carne ficou pronta
primeiro e ele se foi antes de nós. Não poderíamos partir todos
juntos; e por que deplorar o fato, se havemos de ir breve e
sabemos onde o encontrar ?
Adeus.
(Ir:. Benjamin Franklin; Filadélfia (EUA ),23 de fevereiro de
1756...).