Page 2 - Jornal Gueto 2017
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EDITORIAL
Este é mais um número do jornal “Ghetto AS GRADES DA OPRESSÃO
Ouvidos e Vozes”, num esforço para expres-
sar os problemas que afetam as comunidades O encarceramento dos africanos na diáspo-
africanas em Portugal, e ser parte ativa na ra é um dos aspetos mais graves da nossa
busca de soluções para as nossas vidas. Infe- condição atual no mundo. A prisão é uma
lizmente os obstáculos que enfrentamos não das maiores armas da hegemonia europeia
dão mostras de querer desaparecer, muito contra os africanos, e faz parte das várias
pelo contrário. Continuamos a ressentir as formas de genocídio de que temos sido alvo.
consequências do colonialismo e da escrava- Quando se fala em genocídio, geralmente
tura, que contrariamente ao que muita gente pensa-se no aniquilamento ou extermí-
pensa não são coisas do passado, mas sim nio direto de grupos humanos. No entan-
processos que apenas mudaram de forma. to, nós temos sido alvo de várias formas de
Basta pensarmos que ainda estamos depen- genocídio, diretas e indiretas, desde assassí-
dentes dos europeus em áreas fundamentais nio em massa a prevenção de nascimentos.
da vida como cultura, política, economia Esse genocídio tem sido promovido e prati-
e religião. Ainda temos a ilusão de que o cado ao longo da história por europeus, ára-
problema do opressor é nosso problema e bes e judeus, variando conforme se trate de
procuramos a solução para os nossos prob- casos que acontecem no continente africano
lemas na solução que o opressor nos oferece. ou fora dele. O emprisionamento de africa-
Não estamos a andar com os nossos próprios nos fora de áfrica não é mais do que uma
pés, e o facto de estarmos na europa, muitas continuidade daquilo que acontecia no tem-
vezes apenas nos afasta mais da liberdade po do tráfico dos nossos antepassados escra-
e autonomia de que necessitamos. A nossa vos, em que não dispúnhamos dos nossos
condição económica e financeira cada vez se próprios corpos. É um ato genocida porque
degrada mais, continuamos a ser mortos bar- os europeus, incluindo os “euro-america-
baramente pela polícia portuguesa, cuja im- nos”, usam o poder que detêm sobre a maior
punidade estamos obrigados a assistir; con- parte dos recursos do planeta para se im-
tinuamos a ser despejados de forma injusta porem pela força, e obrigar-nos a viver em
das nossas casas; as prisões pintam-se de cor condições insuportáveis de vida. Eles criam
negra; somos desavergonhadamente segre- as condições sociais que justificam o nosso
gados no trabalho, à exceção das áreas que encarceramento, e com isso neutralizam o
servem as necessidades e o entretenimento nosso desenvolvimento coletivo.
das classes que nos oprimem; somos manti- Nos estados unidos, o aprisionamento dos
dos longe dos centros de tomada de decisões afro-americanos é um problema crónico.
que afetam as nossas vidas; portanto, esta- Um em cada 9 homens afro-americanos está
mos a ser brutalizados de todas as formas. É na prisão, sendo 11% da população prision-
por tudo isso que este jornal é a voz de quem al. Um estudo recente mostrou que o núme-
não tem tido voz neste país, e apelamos a ro de afro-americanos presos é superior ao
todos os irmãos e irmãs: juntem-se a nós, número de todos os africanos que foram fei-
juntem-se à Plataforma Ghetto. Com a nos- tos escravos. Isto é pura escravatura moder-
sa união a vitória é certa. Depois de tantos na mascarada pelo estado norte-americano.
séculos de dominação e submissão, chegou A prisão cria um caos completo na
a hora de virarmos o jogo definitivamente. família africana, porque inverte os papéis do
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