Page 41 - Quando chegar a primavera
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róximo à escadaria, na suntuosa Velha Recife, Firmina Avelar,
concentrada, vestia-se, com caprichoso esmero, para o encontro. A
donzela manejava os segredos da magia erótica como dama da
noite, ostentando beleza incomparável aos vinte dois anos de idade.
Estatura mediana, corpo escultural, busto detalhado e uma face deífica,
cujos lábios carnudos emanavam incomparável fascínio, Firmina Avelar
acostumara-se às ofertas de prazer em troca de caríssimos presentes,
proteção judicial, terrenos e diamantes.
A região portuária da Velha Recife, nas longínquas lidas seiscentistas,
na freguesia do Frei Pedro Gonçalves, entre os rios Capibaribe e
Beberibe, Firmina Alves, construíra fama. Vinda dos lastros de
Norteamérica, deixava para traz, Sir Nigel Oto, velhote decadente, que
cometera suicídio, por imputada desonra de adultério e perda de
propriedades. Então, restava-lhe, tão-somente, operar concreta fuga.
Chegou no Nordeste do Brasil faminta e com chagas abertas, por
fissura gástrica. Amparada por meretrizes, não teve escolha, senão,
adotar como hábito, a venda do próprio corpo. Atributos não lhe
faltavam. Consternada pela solidão, tratou de construir amizade com
Diana Flores.
Diana Flores era apreciada, com desconfiança, pelos boêmios. O
dote de suas qualidades físicas é indescritível em beleza. Contudo, algo
incomodava a quem dela se aproximasse. Portava-se como filha da
realeza, que não se podia reconhecer evidências, no ambiente em que
vivia. Traços finos, mãos delicadas, olhar atento. Diana Flores, além de
sedutora, exibia perfeito domínio da manipulação de palavras,
assentada em translúcida inteligência. O vocabulário rebuscado
deixava, em muitas ocasiões, desconfiança da clientela, pois não era
comum, nos arredores, desempenho linguístico formal e exímio
conhecimento de geografia, línguas estrangeiras e política
internacional. Inspirava ingenuidade e atenta comunicação. Nada lhe
escapava à escuta fina, orientada aos detalhes de cada parte de enun -