Page 19 - Revista Mulheres_Ok23_Neat
P. 19

me permite auxiliar na mesma medida em que recebo pedidos de
                      ajuda e isso é muito frustrante”, conta. O hábito de ajudar começou
                      na infância, quando precisou auxiliar a própria mãe, que sofria vio-
                      lência doméstica. Depois, com o tempo, notou que as pessoas procu-
                      ravam por ela espontaneamente para pedir ajuda. Não parou mais.
                      Ela reflete sobre sua atuação. Enquanto a caridade é um ato imediato,
                      o voluntariado solidário chama para ação. “No verdadeiro volunta-
                      riado, você contribui com outra pessoa de forma ativa para que uma
                      transformação realmente aconteça”, diz.
                        Agnes Karlowa de Almeida também acredita que o voluntariado
                      prescinde de uma postura diferenciada. Ela desempenha esse traba-
                      lho há mais de 15 anos.  Mas, as ações ficaram ainda mais recorrentes
                      depois que um acidente grave, há alguns anos, fez com que ficasse
                      impossibilitada de trabalhar. Com isso, decidiu dedicar o pouco tem-
                      po disponível para ajudar aos demais. “As dores são muitas, então
                      tenho que fracionar meu tempo entre deitar, sentar e andar”, revela.
                      Mas nunca falta energia para auxiliar quem precisa.  “Me dei conta de
                      que a fome não pode esperar”, diz.
                        Segundo ela, quando estamos falando de caridade, é preciso ter
                      humildade, respeito e carinho pelo próximo. “Devemos ter muito cui-
                      dado para não expor a pessoa que vamos auxiliar, sendo com palavras,
                      gestos ou atitudes”, pondera. Antes do acidente, Agnes trabalhava há
                      mais de uma década como gerente de uma loja de departamentos.
                      “A gente se segura para ser forte, mas na maioria das vezes a gente
                      chora’’, revela.
                        Patrícia Andrade sabe bem a importância de um voluntariado críti-
                      co na vida das pessoas. Depois de sair de um relacionamento abusivo,
                      em 2017, passou a contar sobre sua história e a ajudar outras mulhe-
                      res que passaram pela mesma situação. Foi quando percebeu que,
                      quanto mais ajudava mais aprendia e, consequentemente, melhor se
                      sentia. “Percebi que com minha experiência de superação eu poderia
                      ajudar outras mulheres’’, conta.
                        Ela também acredita que o trabalho solidário precisa ser realizado
                      com compromisso ético, pois corre-se o risco de humilhar a pessoa
                      que recebe algum auxílio. Além disso, a diferença entre a pessoa ca-
                      ridosa e aquele que exerce um voluntariado solidário é gritante.  “O
                      caridoso vai, ajuda e termina seu trabalho. Já o voluntário está ali
                      constantemente”,  reflete.  Embora  poucos  consigam  perceber  a  di-
                      ferença  entre  voluntariado,  caridade  e  solidariedade,  refletir  sobre
                      a prática do voluntariado pode ajudar a melhorar ainda mais uma
                      atuação que pode trazer grandes benefícios sociais coletivos.
                        Os professores Lucilda Selli e Volnei Garrafa chegaram a analisar
                      justamente as motivações que levam os voluntários a exercerem tal
                      atividade. No levantamento que divulgaram em 2004, perceberam que
                      as pessoas são voluntárias para “ajudar as pessoas”, “tornar as pesso-
                      as mais autônomas”, “contribuir na construção da justiça”, “reduzir
                      as disparidades sociais”, “cumprir com a sua parte como membro
                      da sociedade”. Faltaria, contudo, segundo eles, perceber que, além
                      da disponibilidade interna, a solidariedade crítica é uma prática que                         Foto Luis Gustavo Prado Secom UnB
                      supõe sujeitos engajados, politizados e comprometidos. “A mola pro-
                      pulsora à atividade voluntária solidária é o reconhecimento do outro
                      como sendo um humano igual a cada um de nós e, como tal, digno”,
                      concluíram na ocasião.
                                                                                     Renata Trindade
                                                                                     Agnes Karlowa de Almeida
                                                                                     Patrícia Andrade
                                                                                     Volnei Garrafa, docente da UnB, mais antigo na ativa


                                                                                                         Mulheres Ed. 23 - 19
   14   15   16   17   18   19   20   21   22   23   24