Page 116 - EP 11 completa
P. 116

ESPECIAL  BICENTENÁRIO 2022
                                       1822



             As lideranças dos movimentos        reformas pequeno-burguesas, mas não     mediadas, havia uma diferenciação de
          tenentistas,  após  a  Coluna  Prestes, se-  possuía uma base social.          interesses entre os militares e civis, que
          guiram diferenciados caminhos. Uma         Entre outras interpretações, desta-  se uniram no movimento tenentista. Os
          grande parte se juntaria ao movimento   ca-se também a de José Murilo de Car-  militares moveram-se muito mais pelas
          da Revolução de 1930. Prestes, no exílio   valho (1985), que, apoiando-se na teo-  suas condições militares do que sociais,
          na Bolívia, Argentina e União Soviética,   ria das “instituições totais”, de Goffman,   mas assumiram um papel de represen-
          tornou-se um comunista e se transfor-  aponta para a autonomia das forças ar-  tantes dos setores médios urbanos.
          mou na principal liderança comunista   madas diante dos demais órgãos do Es-             “[...] o tenentismo é liberal-de-
          brasileira nas décadas seguintes. No iní-  tado e, consequentemente, da autono-      mocrata, mas manifesta tendências
          cio dessa trajetória, a recusa do convite a   mia do próprio movimento tenentista,   autoritárias; busca apoio popular,
          Prestes em liderar a Revolução de 1930   que expressava um processo de institu-      mas é incapaz de organizar o povo:
          “consistiu  evidente reconhecimento de   cionalização do Exército na República       pretende ampliar a representativi-
          que a causa ‘tenentista’ era portadora das   Velha. Além disso,                      dade do Estado, mas mantém uma
          melhores esperanças de regeneração po-           [...]  o  tenentismo  seria  um  fe-  perspectiva elitista; representa os
          lítica do país.” (MORAIS, 2005, p. 238).     nômeno de transição, dentro de          interesses imediatos das acamadas
                                                       um processo político mais amplo,        médias urbanas, mas se vê como re-
              As interpretações sobre o                de constituição do intervencionis-      presentante gerais da nacionalidade
                movimento tenentista                   mo militar. As bases desse processo     brasileira. (FORJAZ Apud LANNA
                                                       teriam surgido durante a Primeira       JÙNIOR, 2013, pp. 344-345).
             Sem a pretensão de esgotar as diver-      República, auge da intervenção con-
          sas interpretações sobre o tema, apoia-      testatória e da gestão da intervenção   Para Anita Prestes:  “Os militares
          do em Lanna Júnior (2013), podemos           controladora. O tenentismo seria   refletem em seu comportamento – ain-
          classificar algumas interpretações sobre     um tipo de intervenção contesta-  da que de forma peculiar e modificada,
          o movimento tenentista da seguinte           tória, com fundamentos institucio-  pelo fato de pertencerem à corporação
          forma: como expressão de um movi-            nais, que teria contribuído para o   armada – os conflitos e problemas que
          mento de vanguarda dos setores mé-           desenvolvimento de um outro tipo   se desenvolveram na vida social e políti-
          dios da sociedade, desembocando no           de intervenção, a controladora. Esta   ca da Nação.” (PRESTES Apud LANNA
          caráter burguês da Revolução de 1930.        última explicaria a ação dos militares   JÚNIOR,  2013,  p.  345). Nesse  sentido,
          Os representantes dessa tese são Nelson      em 1930, 1937, 1945 e 1964, quando,   os militares, considerados como uma
          Werneck Sodré, Hélio Jaguaribe, Guer-        ao ugar da política no Exército, ins-  camada social, expressavam interesses
          reiro Ramos, Wanderley Guilherme e           titui-se a política do Exército. (LAN-  de uma camada urbana que não encon-
          Edgard Carone; como movimento mi-            NA JÚNIOR, 2013, p. 343).         trava no aparato político partidário for-
          litar, na lógica interna das forças arma-                                      mas de expressão próprias.
          das, a partir de Vavy Pacheco Borges; a    Edmundo Campos Coelho (1985),           João Quartim de Morais compre-
          perspectiva de Boris Fausto, que defen-  dialogando com Carvalho, aponta o     endia que os tenentes “eram militares
          dia que “os oficiais rebeldes saíram das   movimento tenentista numa outra tran-  de esquerda, convencidos de que só
          classes médias menos favorecidas, mas   sição, aquela que, diante da crise do Esta-  pela força podiam livrar o país das gar-
          o Exército falava mais alto como insti-  do, alinhou o Exército aos interesses de   ras da oligarquia, de seus políticos e de
          tuição que guardava certa autonomia”   frações das elites civis. As crises militares   seus ‘coronéis’” (MORAIS, 2005, p. 214),
          (p. 342) em relação à sociedade, não se   eram manifestações das crises do Estado.   criticando aquelas interpretações que
          tratando de uma relação direta entre os    Nas reflexões de José Maria Bello, na   concebiam o movimento como elitista.
          setores médios e o tenentismo. Para Bo-  década de 1940, e com Maria Cecília Spi-  Quartim de Morais apontou o recruta-
          ris Fausto o tenentismo era defensor de   na Forjaz, surgiram interpretações mais   mento de voluntários em São Paulo du-





       114 ESQUERDA PETISTA #11 - Setembro 2020
   111   112   113   114   115   116   117   118   119   120   121