Page 26 - Relatos de uma Quarentena

velas, coisas que adoro mas não tinha muito betes dela, e por surpresa lá tinha o teste do
tempo. Isso foi fazendo eu ficar mais tranqui-
la, fazer uma quarentena ser mais leve, etc.
Os cuidados continuavam. Quando saía na
rua sempre saía com álcool em gel, e passa-
va o tempo todo nas mãos, ia na casa da mi-
nha mãe mas falava com ela de longe, sem
beijos e abraços. Me cuidava. Tomei a va-
cina contra a gripe na data estipulada para
os profissionais da saúde, por ser da educa-
ção física e na mesma semana comecei a ter
reações da vacina, fiquei com muita tosse e
isso fez eu pensar que poderia estar conta-
minada com o corona vírus, então fiquei em
casa durante uma semana inteira, isolada.
Minha família trazia comida pra mim todos
os dias e no término de uma semana fui ao
médico e não era corona, então fiquei feliz
e tranquila. Os dias foram se passando, fui
trabalhando de casa e cada dia que passava
as incertezas do amanhã só foram crescen-
do, junto com os casos de contaminação e
morte pela covid 19.
fonte: www.santalucia.com.br
Com o passar do tempo, percebi que
comecei a relaxar e já não era tão cuidadosa
quanto a prevenção da doença. Ia ao super-
mercado, por exemplo, e já não ficava aten-
ta no que mexia com as mãos e não passava
mais álcool em gel com tanta frequência, e
assim foi indo. Até que um dia acordei res-
friada, moleza no corpo, achei que seria re-
nite ou coisa do gênero, mas fui percebendo
nos dias posteriores que não sentia sabor
dos alimentos, nem cheiro das coisas aí fi-
quei mais preocupada. Minha mãe um dia
acordou com falta de ar e a levamos no posti-
nho perto de casa pra aferir a pressão e dia-
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Vida na pandemia za desse desgoverno ver- ção de impotência, de tris-
covid, que foi realizado nela, e por surpre- gonhoso que temos, por teza, onde me sinto amarra-
sa maior ainda, deu positivo. Naquele dia Esse longo túnel de cada uma das vítimas. do e por mais que eu queira
nem sei o que eu pensei, mas fiquei bem no medos e incertezas, pare- Não acredito em uma fórmu- fazer algo, existem barreiras
sentido de ver que ela não tinha sintomas, ce que não vai ter um fim. la mágica e um novo mundo que não dependem de mim
porque falta de ar ela sente de vez em quan- Sou uma otimista convicta. pós-pandemia. para quebrá-las, mas quando
do por causa do hipotireoidismo que ela já Algumas pessoas confundem Acredito que a maior acontece isso, mudo o pensa-
possui. Ela fez exame de sangue e tomogra- com “ser boazinha demais”, parte de nós, infelizmente mento e renovo a esperança,
fia do pulmão que confirmaram o vírus nela. “em cima do muro”, “não nada aprendeu e, os pou- pois, quando tudo isso passar,
Por conta disso, no dia seguinte fui fazer o ter opinião”... Mas aprendi a cos que tirarão lições des- e se Deus quiser vai passar,
teste e deu positivo pra mim também. Pas- conviver e gostar da minha ses “novos tempos”, serão começará um novo tempo,
sei, a partir daí, a dormir na casa da minha gentileza e otimismo. Não tidos como inconvenien- novos planos, novas ideias,
mãe e ficar com ela o dia todo. Estou aqui vejo mais como um defeito, tes, loucos, exagerados... novos sonhos...
ainda, graças a Deus ela não tem sintomas e sim como uma virtude que Pois o pior terá passa-
e está bem, mas devido aos outros proble- busco cultivar a cada dia. do! Discordo plenamente.
mas que ela tem não durmo uma noite intei- Em certos momentos desse Me resta estar na compa- Mario Alexandre P. Borges
ra direta, porque ela acorda todas as noites longo túnel tenho visto até nhia de meus pares e tomar
se queixando de algo e acordo junto para meu extremo otimismo ser as rédeas da situação, como
ajudá-la. Estou bem também, me sinto total- desafiado. Entrei em deses- formadores de opiniões que
mente recuperada, mas tenho receio de sair pero, achei que era o fim do somos. Fazer a nossa parte
normalmente e ainda poder transmitir pra mundo (literalmente), achei verdadeiramente, seja a dis-
alguém esse maldito vírus. que não conseguiria, que não tância, em greve pela vida,
É triste saber de pessoas conhecidas que conseguiríamos (de fato ain- em presença com vacina...
se foram, de familiares de pessoas conhe- da não conseguimos, mas es- Talvez o sentido da palavra
cidas que partiram, ver pessoas perdendo tamos caminhando). Precisei “saudade” tenha se modi-
seus empregos, sofrendo de alguma forma conviver com o retorno de ficado para mim. Eu nunca
ou de outra. Por isso no início da pandemia, um trauma antigo, que pare- tinha sentido SAUDADE de
onde o governo ainda não havia dado o au- cia adormecido, a Síndrome verdade.
xílio emergencial para as pessoas, fui levar do Pânico. Sei que não fui a
a algumas famílias cestas básicas que con- única, sei que isso aconteceu
seguimos arrecadar na igreja e levar uma com muitos e muitas, mas foi Karina Aparecida da Silva
palavra de conforto, foi aí que vi de perto um momento doloroso. Me
tanta gente sofrendo. E infelizmente nesse julgava curada e de repente,
período também perdi uma tia muito queri- lá estão os batimentos a 150,
da, não para a covid, mas a dor é a mesma. tremores, falta de ar, suor
Sinto falta de poder sair “despreocupa- frio, dores no corpo... Foram Começa 2020, começa um
da” pelas ruas, passear, ir a lugares, mas isso noites difíceis até voltar a ser novo tempo, novos planos,
não é nada perante o sofrimento das pesso- medicada, refazer técnicas novas ideias, novos sonhos....
as ao perder quem se ama. Então aguento de respiração que tinham fi- Aparentemente um ano nor-
ficar em casa por esse motivo. cado no passado e reapren- mal, que apesar das expec-
Vejo lives, vejo pronunciamentos do go- der a conviver com a tão tativas, teríamos alegrias, de-
verno, vejo reportagens e mesmo assim não temida Síndrome do Pânico. safios e frustações como em
sei o que esperar da volta às aulas presen- Ouvi inúmeras histórias de qualquer outro ano, porém,
ciais neste ano, diante de casos crescendo, pessoas próximas atingi- esse ano está sendo diferente,
pessoas morrendo... Só acho que isso não das pelo vírus (embora ain- pois, o que parecia que estava
vai dar certo. da não tenha vivido na fa- tão longe, de repente estava
mília) e senti por cada uma batendo à nossa porta e “do Fonte: www.fronteiras.com
delas os horrores que essa nada” tudo parou.
Juliana Maria nova realidade nos trou- Confesso que ainda estou
xe. Sofri como se fosse co- meio perdido, e quem não
migo a indiferença e frie- está? As vezes dá uma sensa-
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