Page 9 - Teatros de Lisboa
P. 9

Breve referência histórica ao início do Teatro em Lisboa


                          Breve referência histórica ao início do Teatro em Lisboa

                     «Reparando para as rubricas iniciaes dos Autos de Gil Vicente, vê-se que elles foram na maior parte re-
               presentados na corte de Dom Manoel e Dom João III, nos Paços da Ribeira, em Almeirim, Evora, Coimbra e
               Thomar ; algumas vezes representou o insigne comico a pedido da Abbadeça de Odivellas, e da Viuva de
               Dom João II, ou na procissão de Corpus. Por estas indicações, não se póde deduzir que o povo assistisse a
               taes espectaculos; apenas na farsa de Quem tem farellos? se diz, que o povo lhe dera este titulo. No Auto de
               El-Rei Seleuco, de Camões, vê-se pelo prologo, que a representação era feita em um Pateo ou corro, para
               divertimento de um particular que assim regalava seus amigos.
                     É de suppor, que as comedias representadas diante do povo fossem introduzidas pelas Companhias
               ambulantes hespanholas,  que percorriam a Peninsula; na linguagem popular ainda se encontra a palavra
               Moiganga, que descobre  este uso. Segundo Rojas, a  Moiffanga  era  uma Companhia  formada  de  duas
               mulheres, cinco ou seis comediantes , com um repertorio de seis peças, tendo quatro cavalgaduras, duas para
               levarem os caixões do vestuario, e as outras duas para irem montados, revezando-se. Na lingua portugueza
               existe palavra  Cambaleo y que  accusa a vinda a  Portugal de Companhias hespanholas, formadas de uma
               mulher ue canta, e de quatro homens  que  berram,  tendo no spertorio uma comedia,  dois autos,  e trez  ou
               quatro interimedios. Cambaleo, demorava-se de ordinario seis dias em cada terra.
                     É a contar  da  influencia  e governo dos Philippes,  que  a imitação directa do theatro hespanhol se
               manifesta em Portugal; Francisco Rodrigues  Lobo,  que  tambem cultivou a forma dramatica,  diz  que dos
               hespanhoes nos veiu a designação de jornadas ; foi tambem de Hespanha que tornámos o theatro como um
               divertimento popular.  No  meado do seculo XVI  o theatro recebeu  em  Hespanha uma forte perseguição  da
               auctoridade  ecclesiastica;  era  costume  lá,  fazer-se  as  representações  em  pateos,  ou  pequenos  largos,
               servindo as janellas das casas vizinhas de camarotes para os espectadores.


































                      Para  vencer  os  escrupulos  da  auctoridade  ecclesiastica,  ou  como  condemnação  do  divertimento
               profano, as Companhias dramaticas foram forçadas a darem parte do rendimento das suas recitas para os
               hospitaes e instituições de caridade. Isto se deu egualmente em Portugal, duante o reinado dos Philippes.» in
               “Historia do Theatro Portuguez” por Theophilo Braga, 1870.

                     Em Portugal, e no século XVII, as festas teatrais estavam confinadas aos espaços privados do Paço
               Real, da  Igreja e  da Universidade  -  incluindo os  colégios jesuíticos  -, embora a baixa nobreza  e a plebe,
               sobretudo a plebe lisboeta mais endinheirada, tivessem à sua disposição alguns pátios onde vinham fazendo
               furor as comédias "de capa e espada" de origem espanhola. E se bem que este tipo de espectáculo tenha
               sofrido algum descrédito a partir da Restauração de 1640, só muito lentamente o gosto daquele público se vai
               afazendo  às adaptações  das peças  dos  autores italianos (Alfieri, Goldoni ou Metastasio) ou dos autores
               franceses mais importantes (Molière, Racine, Corneille, Crébillon).

                                                                3
   4   5   6   7   8   9   10   11   12   13   14