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30 Março, 2018
      6                  Sociedade                                                                   Gazeta das Caldas



     Laborinho Lúcio: “o que marca hoje a escola

     pública é a total diversidade”



     Hoje a escola pública é um espaço aberto à diversidade. Deve-se, por isso, abandonar o conceito de “aluno em geral”, e antes aceitar
     que existe uma nova realidade em que há “alunos e alunas, todos diferentes uns dos outros”. Esta foi uma das principais ideias
     defendidas por Laborinho Lúcio, jurista e ex-ministro da Justiça (1990 a 1995), que veio às Caldas a convite do Agrupamento de Escolas
     Rafael Bordalo Pinheiro. A sua intervenção inseriu-se na iniciativa Bordalo Acontece, realizada no dia 21, que incluiu um programa com
     várias palestras.
                                                            Beatriz Raposo                                           Beatriz Raposo

















     Durante um dia, o auditório da Escola Bordalo Pinheiro esteve cheio para o conjunto de palestras que integraram a iniciativa Bordalo   Laborinho Lúcio foi convidado a abordar o tema da educação, tecendo várias críticas ao modelo de ensino em Portugal
     Acontece
     Maria Beatriz Raposo  é professor universitário.  DIVERSIDADE OBRIGA À   ficam contentíssimos, dirão que   tas críticas, já propôs ao minis-  nos. Isto significa “saber quem
     mbraposo@gazetacaldas.com  Embora reconheça que desde o 25   INDIVIDUALIZAÇÃO  tiveram o melhor atendimento,   tro da Educação, Tiago Brandão   eles são e o que podem oferecer,
                        de Abril de 1974 a escola pública tem   mas os que tinham ossos fora do   Rodrigues, que no início de cada   de forma a implicá-los dentro da
     Laborinho Lúcio sabia que o seu dis-  sido a instituição pública com maior   Perante esta diversidade, é uma   sítio e até precisavam de ser ope-  ano lectivo as escolas pudessem   sala de aula”, explicou o jurista,
     curso tocava em pontos que pode-  sucesso em Portugal (pelo seu pa-  “solução frouxa” dizer-se que a   rados, por causa do gesso ficarão   dedicar o seu primeiro momento   que reconheceu que embora a ta-
     riam ser entendidos como polémi-  pel no combate ao analfabetismo,   escola pública, só por si, garante a   empenados para o resto da vida.   de aulas – até ao limite máximo   refa não seja fácil, também não é
     cos – e até provocatórios – para a   no aumento da taxa de inclusão so-  igualdade de oportunidades entre   “Nas escolas, acontece algo de   de um mês – à inclusão dos alu-  uma utopia.
     plateia que compunha o auditório   cial e da literacia), Laborinho Lúcio   os alunos. Para ilustrar este pon-  semelhante porque o método é
     da Escola Rafael Bordalo Pinheiro.   defendeu também que existe hoje   to de vista, o jurista deu o exem-  que no primeiro dia de aulas os
     Mais ainda porque a maior parte   uma nova realidade nos estabeleci-  plo de uma corrida de 100 me-  professores apliquem aos alunos   Bordalo acontece
     dessas pessoas eram professores.   mentos de ensino. “Transitámos da   tros em que são colocados lado   o ‘gesso’ que é a norma. Só que
     Por isso, pediu-lhes colaboração,   escola burguesa (de elites) para a   a lado um velocista, uma pessoa   aqueles que vêm com as fractu-
     antes mesmo de iniciar a sua in-  escola de massas, em que os pro-  com dificuldades de mobilida-  ras expostas, vão contrariá-la,   A palestra de Laborinho Lúcio, de-  “Queremos que eles criem pon-
     tervenção: “gostava que aqui se   fessores aprenderam que o funda-  de, uma criança e um idoso. “Os   provocando indisciplina”, com-  signada “Educação e Cidadania:   tos de referência que facilitem
     criasse uma dinâmica intelectual,   mental é encontrar um padrão de   100 metros são iguais para to-  parou o convidado.  o perfil do aluno”, inseriu-se   a sua entrada no mundo pro-
     que cada um de vós, como conhe-  igualização, criando critérios que   dos, mas obviamente ganha o   Também o modelo de avaliação   na iniciativa Bordalo Acontece,   fissional”, explicou a professora
     cedor que é deste tema – a edu-  depois apontam para uma média”,   velocista. O mesmo se aplica à   é outro problema que não pro-  promovida pela primeira vez na   Maria João Dias, realçando que
     cação – se disponibilizasse a in-  explicou, realçando que o panorama   escola”, afirmou, realçando que   move a inclusão dos alunos. “O   Escola Secundária Rafael Bordalo   os alunos foram incentivados a
     terrogar-se a si mesmo à medida   se modificou a partir do momento   a diversidade nas escolas obriga   teste de diagnóstico é exem-  Pinheiro. Este evento faz parte do   sair da sua zona de conforto e
     que trocamos impressões”.   em que o ensino passou a ser obri-  à individualização dos alunos e   plo disso porque se há crianças   projecto Step1 do CATEC (Campo   a participarem em novas expe-
     Logo em seguida, fez a primeira   gatório após a instrução primária.   a que os professores conheçam   que não querem estar na escola,   Tecnológico de Aveiro) que visa   riências que os enriqueçam en-
     “provocação”. “O espaço público   Actualmente, as crianças são obri-  cada um deles.   este teste mostra-lhes que são   dar competências aos alunos   quanto pessoas.
     português está vazio de professo-  gadas a frequentar a escola até ao   Fã de caricaturas, Laborinho Lúcio   incapazes para estar na escola.   dos cursos profissionais para a   Esta iniciativa serviu ainda para
     res”, disse Laborinho Lúcio, acres-  12º ano. “E se o Estado impõe esta   utilizou mais uma para reforçar   Contribui para a sua exclusão”,   procura do seu primeiro empre-  a apresentação das propostas
     centando que as únicas ocasiões em   regra, então deve garantir igual-  a mesma ideia. Imagine-se que   defendeu Laborinho Lúcio, cri-  go. Para o Bordalo Acontece fo-  ao Orçamento Participativo
     que os docentes saem para a rua é   mente a inclusão de todas e de   chega a um hospital a notícia de   ticando igualmente o facto dos   ram também convidados repre-  das Escolas, tendo o projec-
     com o objectivo de reivindicarem os   cada uma destas crianças”, disse   que um autocarro teve um aci-  momentos de avaliação estarem   sentantes de entidades como a   to das alunas Joana Antunes,
     seus direitos de natureza corporati-  Laborinho Lúcio. Para isso, é fun-  dente e há feridos. E que a solu-  calendarizados desde o início   AIRO (Associação Empresarial   Mariana Santos e Joana Costa
     va. Mas é preciso fazer mais. É ne-  damental entender que em vez de   ção do seu director é enviar a sua   do ano lectivo. “Como é que os   da Região Oeste), o IEFP (Centro   sido o mais votado. As jovens
     cessário que “os professores não   uma escola de massas, hoje depa-  equipa de ortopédicos com a ins-  professores sabem que naque-  de Emprego), o CLSD (Contrato   propuseram a aquisição de mo-
     percam por falta de comparência   ramo-nos com um espaço marcado   trução de engessá-los a todos. Os   le dia exacto, todos os alunos   Local de Desenvolvimento Social   biliário para melhorar os espaços
     e sejam os verdadeiros lutado-  pela diversidade, onde não existe “o   resultados são vários: quem não   estão em condições de fazer o   – Santa Casa da Misericórdia), a   de convívio dos alunos em vários
     res pelas questões da educação   aluno, mas os alunos e as alunas,   precisava do gesso anda um mês   teste?”, questionou.   rede EURES, a Education First,   locais da escola. Prevê-se que o
     no espaço público”, acrescentou   todos diferentes uns dos outros”.  zangado com o hospital, aqueles   Laborinho Lúcio contou ainda   a Intercultura AFS e o Instituto   orçamento será de cerca de 1030
     o jurista, de 74 anos, que também     que tinham pequenas fracturas   ao público que, a propósito des-  Politécnico de Santarém.   euros.  M.B.R
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