Page 69 - Quando chegar a primavera
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Por onde andaria, Flávia, caso existisse vida após a morte? Continuaria
em consciência e afeto, a sentir as emoções e sentimentos de quem ama? -
pensava, melancólico, Alexandre. Sem notar, Caio Trigueiro, em ruidosa
euforia, como peixe fora d'água, com a sagacidade de caçador,
importunava com barulho indigesto, na companhia de amigos nada
interessantes, a multidão. Desde cedo, óbvio que Caio Trigueiro já havia
notado o irresistível bloqueio e relativo pavor, durante as raras
oportunidades de encontrar na casa dos Bolton, Alexandre. Naquele
cenário, tudo lembra aos antepassados de ambos. Melhor mesmo,
evitar o contato. Entre eles apenas a lembrança acolhedora de Claudio
Ferraz. Alexandre, evitando ser notado, esconde-se por detrás de
esculturas valiosas.
Alexandre considerava ultrajante, o amparo jurídico, destinado a
Caio Trigueiro, por oferta de testamento do Senhor Ferraz, desde 1962,
oito janeiros antes do nascimento do órfão de pai, mãe e vida, nos idos
de 1970. Não bastava Manoel Trigueiro, pai de Caio, ter infernizado a
vida de todos os membros da família, desrespeitando lutos e dores,
escarnecendo da desdita, a qual Túlio Bolton imputou a si mesmo, o
raptor, escalonava-se com prioridade, no cultivo exclusivo de amizade
com o jovem Bolton. Então - pensava Alexandre - aquele adolescente,
não merecia os cuidados prestados e nem as propriedades herdadas. Se
Caio Trigueiro estava gozando de vida fácil, era em nome de recursos
mínimos, deixados como herança pelo contabilista dedicado. Então,
aquele desperdício, em pompa e glamour, logo-logo cessaria.
O desgaste afetivo junto a Túlio, chegou ao estado exponencial, logo
após a morte do pai de Caio, Manoel Trigueiro. Túlio demonstrava-se
agitado, nas situações ligadas ao agravamento de saúde que sofria. A
coriza intensa, avançando para complicações orofacial, na evolução
clínica de rinites, alergias e inflamações na garganta, perturbavam-no.
As inúmeras tentativas de Alexandre em amainar os tormentosos
desarranjos eram tomadas como graves ameaças à vida. Túlio Bolton
sentia leve desprezo por Alexandre, pois, como se sabia, elegeu a
companhia constante de Trigueiro, dentre todas, como a melhor opção
na dor. A partilha mútua de interesses, regada a narcóticos de
desregrada potência, viciava-os. Assim, não era tão simples esquecer o