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Capítulo 5 Victor Gatopardo
Victor Gatopardo escondia um segredo num cantinho bem afastado e obscuro
da memória e do coração, mas que reaparecia inesperado e inconveniente
sempre que ele se esquecia dos truques para afastar a tristeza. Abatia-se
então, perdia o brilho e sua personalidade carismática, cálida, envolvente,
adquiria contornos cinzentos e Victor se transformava num ser cabisbaixo de
movimentos lentos.
A metamorfose podia durar dias e era sempre enfrentada por Victor com um
voluntário isolamento. Semelhante ao tratamento das enxaquecas crônicas
que só encontram alívio nos refúgios da penumbra e do absoluto silêncio.
O segredo era um segredo só dele. E mesmo os mais íntimos e que o amavam
e que se referiam a estes momentos como um traço de tendência a melancolia
natural do seu caráter, sem excessiva preocupação porque Victor reagia a tais
declínios de ânimo com força e coragem, não desconfiavam da verdade.
Constantes autoanálises haviam convencido Victor sobre a natureza do seu
segredo e incapaz de eliminá-lo Victor criou métodos para ao menos controlá-
lo e estava convencido que as ocasionais depressões eram um sintoma deste
esforço. Assim fora desde sempre ou ao menos desde que tinha memória de si
mesmo e Victor atribuía a existência do tal terrível defeito a sua origem e
educação.
Agora, já na altura da vida em que as obrigações com o trabalho davam lugar
as muitas horas de contemplação da própria existência e em que podia
esquecer o correr do tempo em prol das longas caminhadas pelas largas ruas
que o levavam de volta ao casarão familiar vindo dos poucos destinos
rotineiros que ainda mantinha, Victor se surpreendia a avaliar o seu segredo
cada vez com mais constância e com crescente complacência. Descobriu, a