Page 40 - Os Lusiadas Contados as criancas e lembrado ao povo
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maneira alto que, diz- -se, por baixo das suas pernas passavam à vontade
enormes navios!...
«Num tom de voz grossa, como a voz do mar profundo, começou a falar-
nos.
«Arrepiámo-nos todos, só de ouvir e de ver tão monstruosa criatura.
«Disse então o Gigante, voltando-se para nós:
— «Ó gente ousada mais do que nenhuma outra, que nunca descansais de
lutas e combates, já que não temeis ultrapassar os limites onde ninguém
mais chegou, e navegar os mares que me pertencem; já que vindes devassar
os meus segredos escondidos, que nenhum humano deveria conhecer —
ouvi agora os danos que prevejo para vós, para a vossa raça, que subjugará
no entanto ainda todo o largo Mar e toda a imensa Terra.
«Ficai sabendo que todas as naus que fizerem esta viagem encontrarão —
castigo merecido do seu atrevimento sem par! — as maiores dificuldades
nestes meus domínios. E sofrerão o horror de tormentas desmedidas.
«Punirei de tal modo a primeira armada que vier aqui depois da vossa frota,
que os seus tripulantes mal sentirão
talvez o perigo de me defrontarem. Mas hão de chorar depois o dano que
eu lhes fizer...
«Hei de me vingar de quem primeiro me descobriu, do vosso Bartolomeu
Dias, fazendo-o naufragar aqui mesmo.
«E outras vinganças imprevistas executarei...
«D. Francisco de Almeida deixará aqui a sua glória e os troféus que arrancar
aos Turcos. Manuel Sepúlveda verá aqui morrer os filhos queridos, verá
aqui sofrer mil ferimentos a sua mulher, que os negros cafres hão de
torturar e matar.