Page 23 - As Viagens de Gulliver
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pés de comprimento por quatro de largura, e com vinte e duas rodas. Assim que
o deram por concluído, conduziram-no ao lugar em que me encontrava. A
principal dificuldade, porém, estava em levantar-me e colocar-me naquele
carro. Com esse fito, fincaram no chão oitenta varas, tendo cada uma dois pés de
altura; cada uma delas era munida, na ponta, de uma roldana pela qual passavam
cordas muito fortes, da grossura de uma guita, com ganchos que iam prender-se
em cintos que os operários haviam colocado em volta do pescoço, das mãos, das
pernas e de todo o corpo. Novecentos homens dos mais robustos foram
empregados a puxar as cordas por meio de um elevado número de polés ligadas
às varas, e, por essa forma, em menos de três horas, fui levantado, colocado e
ligado à máquina. Sei tudo isso pela narração que depois me fizeram, porque,
enquanto durou aquela manobra, dormia eu profundamente. Quinhentos cavalos,
dos maiores que existiam nas cavalariças imperiais, tendo cada um a altura de
quatro polegadas e meia, foram atrelados ao carro, e arrastaram-no na direção
da capital, que ficava à distância de um quarto de légua.
Tinha já quatro horas de caminho, quando fui subitamente acordado por
um acidente deveras ridículo. Os condutores haviam parado para arranjar
qualquer coisa, e uns três habitantes do país tiveram a curiosidade de examinar o
meu rosto enquanto dormia; e, avançando cautelosamente até a minha cara, um
deles, capitão dos guardas, enfiou a aguda ponta da alabarda na minha venta
esquerda, o que me fez comichão no nariz, acordou-me e obrigou-me a espirrar
três vezes. Caminhámos durante o resto do dia e acampámos à noite, com
quinhentos guardas, metade com archotes e metade com arcos e flechas, prontos
a descarregá-las ao primeiro movimento que eu fizesse.