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Trabalho e proletariado no século XXI
O precariado é inerentemente instável, seus
membros estão sempre prontos para um
trabalho incerto, não têm controle sobre
seu tempo e dependem exclusivamente do
salário para sobreviver (porque não têm
direitos trabalhistas)
são antiquados demais para capturar a complexidade de muitas relações de
trabalho modernas (O’CONNOR, 2015, tradução nossa).
A expansão de “novas” formas de trabalho e o anacronismo da regulação pro-
tetiva do trabalho têm sido fortemente reivindicados por instituições privadas, como
a Confederação Nacional da Indústria (CNI) no Brasil:
A disseminação das tecnologias da informação criou um novo mundo para
o trabalho. Existem atividades intensivas em conhecimento que podem
ser desenvolvidas por um grupo de pessoas espalhadas pelo país ou pelo
mundo. Sendo especializado, esse tipo de trabalhador pode atender às de-
mandas de diferentes empresas. Você pode trabalhar em casa, sem perder
tempo no trânsito, determinando seus horários da maneira que melhor lhe
convier. No entanto, as modernas relações de trabalho do século XXI ain-
da são reguladas por normas obsoletas da primeira metade do século XX
(CNI, 2010, p. 109).
As características desse novo mundo do trabalho, ainda que tomadas de ma-
neira crítica, também informam a análise de Standing (2014; 2016). Segundo o autor,
o mundo está passando por uma transformação global análoga à grande transforma-
ção identificada por Karl Polanyi (2000). Hoje, no entanto, o sistema de mercado é
global, enquanto Polanyi analisara a criação de economias de mercado nacionais. O
precariado emergiu dessa nova estrutura, sendo uma classe caracterizada por incer-
teza e insegurança crônicas. Standing afirma que o precariado apresenta diferentes
relações de produção, distribuição e direitos em comparação com os assalariados e
o proletariado. O precariado é inerentemente instável, seus membros estão sempre
prontos para um trabalho incerto, não têm controle sobre seu tempo e dependem Revista Princípios nº 159 JUL.–OUT./2020
exclusivamente do salário para sobreviver (porque não têm direitos trabalhistas). Em
resumo, Standing afirma que, enquanto na grande transformação o capital nacional ad-
mitiu um trabalho estável para o núcleo do proletariado, hoje o capital global impõe
completa instabilidade ao precariado. O autor vê essa diferença como fundamental
para diferenciar o precariado de outras classes.
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