Page 296 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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morreu, Mike estava marcado para morrer. Você sabe quem o marcou? Tessio. Assim Tessio
teve de ser morto. Porque a traição não pode ser perdoada. Michael poderia perdoá-lo, mas as
pessoas nunca perdoam a si mesmas e assim são sempre perigosas. Michael gostava mesmo de
Tessio. Ele adora a irmã. Mas estaria faltando ao seu dever para com você e seus filhos, para
com toda a Família, para comigo e minha família, se deixasse Tessio e Carlo irem embora
livremente. Eles seriam um perigo para todos nós.
Kay ouvira tudo isso com as lágrimas nos olhos.
— Foi isso o que Michael mandou você aqui me dizer?
Hagen olhou para ela com verdadeira surpresa.
— Não — respondeu Tom. — Ele me pediu que eu lhe dissesse que você é o Don dele. Isto é
apenas uma brincadeira.
Kay pôs a mão no braço de Hagen e perguntou:
— Ele não mandou você me dizer todas as outras coisas?
Hagen hesitou por um momento como se estivesse se debatendo se devia contar a ela uma
última verdade.
— Você ainda não compreende — disse ele. — Se você contasse a Michael o que eu lhe
disse hoje, aqui, eu seria um homem morto. — Ele fez nova pausa e arrematou. — Você e os
filhos são as únicas pessoas neste mundo a quem ele não pode fazer mal.
Passaram-se uns longos cinco minutos para que Kay se levantasse da grama e eles
começassem a caminhar de volta para casa. Quando já estavam chegando, Kay perguntou a
Hagen:
—. Depois do jantar, você pode levar a mim e as crianças para Nova York no seu carro?
— Foi para isso que eu vim — respondeu Hagen.
Uma semana depois que voltou para a companhia de Michael, Kay foi a um padre instruir-
se para se tornar católica.
Do recesso mais profundo da igreja o sino soou o toque de arrependimento. Como lhe
haviam ensinado a fazer, Kay bateu ligeiramente no peito com a mão fechada, a batida de
arrependimento. O sino soou novamente e ouviu-se o arrastar de pés, quando os comungantes
deixaram seus assentos para ir até a grade do altar. Kay levantou-se para se juntar a eles.
Ajoelhou-se perante o altar, e do fundo da igreja veio novamente o som do sino tocando. Com a
mão fechada, ela bateu outra vez no coração. O padre estava diante dela. Kay inclinou a cabeça
para trás e abriu a boca para receber a hóstia. Foi o mo mento mais terrível de todos. Até que se
derreteu e ela pôde engolir e fazer o que viera ali realmente fazer.
Lavada do pecado, uma suplicante atendida, ela baixou a cabeça e cruzou as mãos na grade
do altar. Mudou a posição do seu corpo para aliviar o peso que incidia sobre os seus joelhos.
Livrou a mente de todos os pensamentos a respeito de si mesma, de seus filhos, de todo
rancor, de toda rebelião, de todas as dúvidas. Depois, com um desejo profundo e realmente
espontâneo de crer, de ser ouvida, como fazia todos os dias desde a morte de Carlo Rizzi, ela
pronunciou as necessárias orações pela alma de Michael Corleone.