Page 73 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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exposto. Não obstante, é importante sublinhar que diante da tutela cautelar deve haver probabilidade
                  do  direito  à  tutela  que  se  pretende  assegurar  cautelarmente,  mais  perigo  da  sua  inefetividade  ou
                  perigo de dano à situação que se pretende tutelar mediante a declaração ou a (des)constituição.

                     A  probabilidade  do  direito  à  tutela  jurisdicional  assemelha-se  à  probabilidade  do  direito  que
                  legitima a tutela antecipada, porém o perigo não justifica a antecipação da tutela (por exemplo, tutela
                  inibitória)  nem  a  proteção  de  um  direito  “conexo”  que  depende  da  antecipação  da  tutela  (tutela
                  antecipada  de  soma).  O  perigo  é  de  inefetividade  da  tutela  jurisdicional  do  direito  ou  de  dano  à
                  situação que depende das tutelas declaratória ou (des)constitutiva.

                     Significa dizer que, na tutela cautelar, a justificativa deve recair sobre a probabilidade do direito à
                  tutela jurisdicional final e sobre o perigo de que esta tutela venha a não ser prestada na forma efetiva
                  ou de que a situação que depende das tutelas declaratória ou (des)constitutiva venha a sofrer prejuízo
                  no curso do processo.

                     Nesta  dimensão,  a  justificativa  deve  considerar  a  necessidade  de  asseguramento  ou  de
                  acautelamento  de  uma  tutela  jurisdicional  de  direito  já  solicitada  ou  que  possa  ser  requerida,  ou
                  mesmo de uma situação concreta que dependa de tutela declaratória ou (des)constitutiva já pedida ou
                  que deva ser pedida.

                     8.12. Perigo enquanto conceito que guarda em si a probabilidade
                     Tendo em vista que o art. 300 do Código de Processo Civil fala em probabilidade do direito, mas não
                  em probabilidade do perigo, cabe indagar se o juiz, para conceder a tutela de urgência, deve formar
                  convicção que ultrapassa a probabilidade. Calamandrei preocupou-se com a demonstração da certeza
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                  do perigo para a legitimação da tutela cautelar.  Porém, a questão da certeza ou da probabilidade em
                  relação ao perigo, quando melhor analisada, torna-se uma questão falsa, na medida em que o conceito
                  de perigo, assim como o de ameaça, contém em si a presunção de algo ou da prática de um ato, ou seja,
                  a própria probabilidade de prejuízo.

                     Tanto  a  ameaça  quanto  o  perigo  dizem  respeito  a  eventos  futuros,  obviamente  insuscetíveis  de
                  demonstração mediante prova direta. Certamente não há como provar um fato futuro. O que pode ser
                  provado, nestas situações, são fatos passados capazes de demonstrar um acontecimento futuro ou que
                  se  teme.  Portanto  é  preciso  a  prova  de  fatos  indiciários  que  permitam  ao  juiz,  mediante  raciocínio
                  presuntivo, formar um juízo que permita a conclusão de que há ameaça ou perigo. O juiz, em outras
                  palavras, somente pode chegar na presunção de que algo vai acontecer, vale dizer, de que há perigo.

                     A  presunção,  para  poder  ser  considerada  legítima,  depende  de  racionalização  mediante
                  justificativa que considere a prova do fato indiciário, os elementos que guiaram o raciocínio judicial
                  presuntivo, particularmente as regras de experiência,  e a conclusão estabelecida. Ora, para o juiz
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                  verificar  se  o  fato  indiciário  aponta,  e  em  que  medida,  para  a  situação  concreta  de  perigo,  deve
                  raciocinar com base em regras de experiência. Bem por isso, não apenas a prova dos fatos indiciários,
                  mas  também  as  regras  de  experiência  devem  ser  relatadas  e  motivadas  na  decisão  para  que  seja
                  possível aferir a consistência da sua base empírica e a sua eventual arbitrariedade. 169

                     Como se vê, o perigo nada mais é do que a presunção de fato futuro, de forma que é falso indagar
                  se deve haver convicção de probabilidade ou de verdade acerca do perigo. Presunção não é fato nem
                  prova;  presunção  é  juízo,  assim  como  a  convicção.  É  verdade  que  uma  situação  concreta  pode
                  comportar duas ou mais presunções, que podem convergir ou ter sentidos contrários, a demonstrar
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                  que a convicção pode se fundar na valoração de duas ou várias presunções.  Mas isso não significa
                  que seja correto pensar em presunção provável, o que seria o mesmo do que falar em convicção de
                  probabilidade sobre o perigo. O perigo não pode exigir outra coisa que não a simples presunção ou
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