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vivida, mas o registro de que estiveram lá sem estar. Viajam para colecionar imagens, não
para viver experiências e serem transformados por elas. Para estes, a imagem vale mais que
a vida, quase a substitui. A vida é risco — a fotografia pode ser manipulada e melhorada com
photoshop. Vão descobrir onde estiveram ao se assistirem sorridentes, em diferentes
cenários, nos quais posaram como personagens de si mesmos.
Assim como há aqueles que esperam que uma viagem vá mudar radicalmente o curso de
sua existência. É possível que mude. Mas talvez não do jeito que esperam, se o que esperam
é se transformar num outro.
Toda viagem é sem volta e leva sempre ao mesmo lugar: a nós mesmos. Ao final de cada
uma, o melhor que podemos esperar é termos nos tornado mais o que somos. Ter alcançado
porções mais longínquas de nossa própria geografia, mesmo que esta seja uma floresta
densa e sombria. Ter sido ampliado pela experiência de se arriscar a olhar para dentro,
escalando nossas próprias montanhas, mais altas que o Everest, e atravessando nossos rios
internos a nado, ainda que eles estejam infestados de piranhas e jacarés esfomeados.
Na paisagem interna de todos nós, há partes selvagens que nos provocam medo. Há
monumentos dos que vieram antes, que podem nos pesar ou atrapalhar, ainda que nos
deslumbrem com sua grandeza. Há ruínas que lamentamos, há abismos que nos parecem
intransponíveis e há também largas porções de sol e de praias de águas transparentes se
procurarmos com afinco. Somos variados como o mundo que nos encanta e assusta ao
mesmo tempo. Só precisamos olhar com coragem para o espelho que nos reflete e descobrir
aonde ele vai nos levar. Não há setas indicando o caminho. Como dizem aqueles que moram
na beira das estradas, com precisão mal compreendida, aos viajantes que perguntam por
direção: siga em frente, toda vida.
25 de outubro de 2010