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Porque o melhor e mais honesto que posso oferecer ao meu interlocutor são mais pontos
        de interrogação. E, definitivamente, pontos de interrogação não são populares. O mundo

        exige respostas com pontos finais e, de preferência, exclamações peremptórias.
          Ora, quem sou eu? Não sei quem sou eu. E, quando penso que sei, me escapo. Alguém já
        conseguiu responder a esta pergunta com alguma quantidade razoável de certeza? Ainda

        assim, por não ter uma resposta fácil para uma pergunta que define as relações do nosso
        mundo, tornei-me um incômodo. Mas, como a questão é legítima, tenho me aprofundado

        nela. E, nessa busca para compreender a questão da identidade, deparei-me com uma ótima
        história de Michel Foucault.
          Em uma passagem pelo Brasil, em Belo Horizonte, Foucault foi questionado sobre o seu

        lugar: “Mas, finalmente, qual é a sua qualificação para falar? Qual é a sua especialidade? Em
        que lugar o senhor se encontra?”. Foucault ficou chocado com a “petição de identidade”. A

        exigência, constante em sua trajetória, motivou uma resposta de grande beleza em seu livro
        Arqueologia do saber (Forense Universitária): “Não estou, absolutamente, lá onde você está
        à minha espreita, mas aqui de onde o observo, sorrindo. Ou o quê? Você imagina que, ao

        escrever,  eu  sentiria  tanta  dificuldade  e  tanto  prazer,  você  acredita  que  eu  teria  me
        obstinado em tal operação, inconsideradamente, se eu não preparasse — com a mão um

        tanto  febril  —  o  labirinto  em  que  me  aventurar,  deslocar  meu  desígnio,  abrir-lhe
        subterrâneos, soterrá-lo bem longe dele mesmo, encontrar-lhe saliências que resumam e
        deformem seu percurso no qual eu venha a perder-me e, finalmente, aparecer diante de

        quem nunca mais tivesse de reencontrar? Várias pessoas — e, sem dúvida, eu pessoalmente
        — escrevem por já não terem rosto. Não me perguntem quem eu sou, nem me digam para

        permanecer  o  mesmo:  essa  é  uma  moral  do  estado  civil  que  serve  de  orientação  para
        elaborar nosso documento de identidade. Que ela nos deixe livres no momento em que se
        trata de escrever”.

          Lindo. Michel de Certeau, que, como Foucault, foi alguém que conseguiu escapar dessa
        identidade de túmulo e, ao mesmo tempo, construir um sólido percurso intelectual, analisa
        essa questão em um dos textos de um livro muito instigante: História e psicanálise — Entre

        ciência e ficção (Autêntica). Certeau diz o seguinte sobre o episódio vivido por Foucault em
        Belo Horizonte: “Ser catalogado, prisioneiro de um lugar e de uma competência, desfrutando

        da autoridade que proporciona a agregação dos fiéis a uma disciplina, circunscrito em uma
        hierarquia dos saberes e das posições, para finalmente usufruir de uma situação estável, era,
        para  Foucault,  a  própria  figura  da morte.  (...)  A  identidade  imobiliza o  gesto de  pensar,

        prestando homenagem a uma ordem. Pensar, pelo contrário, é passar; é questionar essa
        ordem, surpreender-se pelo fato de sua presença aí, indagar-se sobre o que tornou possível
        essa situação, procurar — ao percorrer suas paisagens — os vestígios dos movimentos que
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