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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização
lidade à notícia pela mídia. Entre as reportagens, ressalta-se a entrevista
com o atual presidente da CODESA, que desenvolve, a partir da expansão
do Portocel, a criação de um complexo portuário que tornaria o Espírito
Santo referência mundial sem fazer qualquer ressalva a respeito de danos
ambientais e sociais, como a desapropriação e reapropriação privada de
terras e territórios marítimos. Há, também, falas positivas do governador
do estado a respeito da criação do complexo portuário, e até mesmo uma
matéria ressaltando a posição assertiva do presidente da República em re-
lação à expansão do Portocel, demonstrando como é importante a fala po-
sitiva de uma autoridade da esfera pública para a reprodução da ideologia
proposta. Por fim, é assustadora a ausência de informações a respeito dos
danos ambientais que serão causados a partir da ampliação do Portocel.
Nenhuma das matérias direcionadas à ampliação do porto tratam dos
laudos requeridos pelo IEMA, nem da consulta pública realizada com in-
tuito de discutir o planejamento do projeto junto à comunidade e, entre
outras coisas, os eventuais danos ao ambiente geográfico e geopolítico.
A evidência de uma agenda jornalística que inclui grandes projetos de
desenvolvimento exclusivamente no caderno econômico comprova a ne-
cessidade de um jornalismo contra-hegemônico que não se apoie na tra-
dição da neutralidade e objetividade. Retomando Bourdieu (1997), a expe-
riência de romper com a tradição jornalística de neutralidade no campo
jornalístico reescreve, inclusive, as características do campo jornalístico.
Como evidencia Dornelles (2008), a importância de um jornalismo que
atue em conjunto com a comunidade existe principalmente por conta de
uma comunicação menos objetiva dos fatos e mais focada na construção
de processos sociais e na relação dos grupos ali presentes. Esse tipo de
jornalismo, além de humanizar as relações decorrentes do fato, também
desconstrói a tradição da neutralidade, uma vez que esta é usada como
máscara das grandes corporações para operarem o controle informacio-
nal sobre a sociedade sem serem rechaçadas (ou sequer percebidas). Dor-
nelles defende que essa forma de jornalismo, o jornalismo-cívico, seja
também um jornalismo militante que desafie as noções hegemônicas
propostas pelas grandes corporações midiáticas. Posição esta que dialoga
com a seguinte afirmação de Bittencourt:
Cabe então aos intérpretes críticos da teoria da comunicação que
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