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Capítulo 8
se “considerar estratégias que conjugam temporalidade, materialidade e
corporalidade” (CREADO, 2017, p. 11). Taddei reforça:
As disputas simbólicas sobre como representar o ambiente de-
vem ser tomadas em seu viés performático (TADDEI, 2013), ou
seja, em sua dimensão mais propriamente constitutiva, em razão
do fato de que, para poder manipular política e economicamente
a seca, é preciso fazê-la existir como elemento político e/ou eco-
nômico. Ou seja, o que estou afirmando é que não há nada ine-
rentemente biofísico, político ou econômico em uma estiagem;
é o choque entre os fluxos variáveis de substância e energia do
meio ambiente contra os sistemas humanos (e não humanos) de
pensamento e organização do mundo que “precipitam” a seca
enquanto coisa com a qual se pode relacionar – ou seja, a seca é
“inventada” da mesma forma como a cultura o é, na concepção
dada ao termo por Roy Wagner (2010) (TADDEI, 2014, s.p.).
Desse modo, concluímos, a partir de Taddei (2014), que o crime ambien-
tal não é um caso isolado no espaço e no tempo, ele passa por diversos
processos que se desdobrarão ao longo do tempo. Por isso, os surfistas de
Regência deverão passar por adequações quanto a esses ciclos de lama,
principalmente nos períodos de grandes chuvas.
Tim Ingold (2012), em “Trazendo as coisas de volta à vida: emaranhados
criativos nos mundos materiais”, também nos ajuda a interpretar a rela-
ção dos surfistas com os ciclos da lama, pois ele propõe uma separação
dos “objetos” das “coisas”, principalmente a forma como vemos o objeto,
afirmando como devemos “aprender em um mundo mais que humano”
(INGOLD, 2012, s.p). Para isso, Ingold faz uma separação do “objeto”, que
Heidegger definiu como algo que não muda, e das “coisas”, que estão em
constantes mudanças. Para Ingold, as coisas são vivas e estão emaranha-
das nas linhas de devir, que estão em constantes movimentos e são contí-
nuas, fato ao qual podemos relacionar com o movimento tanto humano
quanto material. O ser vivo humano e as coisas não humanas se movi-
mentam, assim como o ambiente. É possível ressaltar, então, usando Tim
Ingold, que o ser-surfista é um ser-surfista-em-movimento, mesmo que
isso signifique a possibilidade de contaminação.
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