Page 288 - LIVRO - ENCONTRO DE RIO E MAR_160x230mm
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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização
obscuro, e evidencia a que veio. Usando as cores dos “patrões” em
forma circular, sua construção demonstra a união das forças, de
suas potências, num movimento anti-ciclônico em torno da pala-
vra RENOVA ao centro. Girando em torno de si, criado o símbolo
determinante que impõem o modus operand[i] que a fez surgir.
RENOVASAMARCO renova a si mesmo retroalimentando, sem
ao menos sinalizar algo que remeta aos que foram atingidos.
A palavra fundação, reduzida, hierarquizada em escala inferior,
em nada é ou representa o que deveria. Ao contrário, mascara a
absorção de fundos e ações, com propósito inverso.
A circularidade do desenho evoca também a recorrência da onda e, de
modo continuado, o ciclo de toxinas, em suspensão novamente e carrea-
das para o mar todas as vezes em que há chuvas rio acima e/ou quando
as águas do oceano tornam-se turbulentas, por exemplo, por conta de
alterações climáticas. Os rejeitos de mineração agora são parte do ciclo
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hidrológico. O gráfico também nos recorda o quão importante é conti-
nuar seguindo as (re)configurações das relações em torno do rio Doce no
contexto de pós-rompimento.
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Como a imagem da onda importa nas várias iterações aqui traçadas?
Para residentes e ativistas, a imagem da onda enfatizou a ruptura da bar-
ragem da Samarco como violência rápida, força fora do lugar, devir fí-
sico-orgânico-tóxico fruto de um erro corporativo. Para as pessoas de
Baixo Guandu, gerou pavor, expectativas e incertezas. Para as pessoas de
Regência Augusta, configurou-se como fantasma físico-material de um
desastre que continua sendo relembrado, repetido, (re)quebrando como
ondas oceânicas contaminadas. Alguns burocratas empresariais e técnicos
estatais procuram minimizar o desastre, evitando palavras como onda
ou lama, dando preferência a termos mais tecnocratas e a que atribuem
maior neutralidade, como turbidez, mancha, pluma, rejeitos e sedimentos.
Nas discussões sobre o rompimento e as suas consequências, as conver-
30 Veja, por exemplo, Budds e colaboradores (2014).
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