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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização

                       obscuro, e evidencia a que veio. Usando as cores dos “patrões” em
                       forma circular, sua construção demonstra a união das forças, de
                       suas potências, num movimento anti-ciclônico em torno da pala-
                       vra RENOVA ao centro. Girando em torno de si, criado o símbolo
                       determinante que impõem o modus operand[i] que a fez surgir.
                       RENOVASAMARCO renova a si mesmo retroalimentando, sem
                       ao menos sinalizar algo que remeta aos que foram atingidos.

                       A palavra fundação, reduzida, hierarquizada em escala inferior,
                       em nada é ou representa o que deveria. Ao contrário, mascara a
                       absorção de fundos e ações, com propósito inverso.

               A circularidade do desenho evoca também a recorrência da onda e, de
               modo continuado, o ciclo de toxinas, em suspensão novamente e carrea-
               das para o mar todas as vezes em que há chuvas rio acima e/ou quando
               as águas do oceano tornam-se turbulentas, por exemplo, por conta de
               alterações climáticas. Os rejeitos de mineração agora são parte do ciclo
                          30
               hidrológico.  O gráfico também nos recorda o quão importante é conti-
               nuar seguindo as (re)configurações das relações em torno do rio Doce no
               contexto de pós-rompimento.



                                                ○


                  Como a imagem da onda importa nas várias iterações aqui traçadas?
               Para residentes e ativistas, a imagem da onda enfatizou a ruptura da bar-
               ragem da Samarco como violência rápida, força fora do lugar, devir fí-
               sico-orgânico-tóxico fruto de um erro corporativo. Para as pessoas de
               Baixo Guandu, gerou pavor, expectativas e incertezas. Para as pessoas de
               Regência Augusta, configurou-se como fantasma físico-material de um
               desastre que continua sendo relembrado, repetido, (re)quebrando como
               ondas oceânicas contaminadas. Alguns burocratas empresariais e técnicos
               estatais procuram minimizar o desastre, evitando palavras como onda
               ou lama, dando preferência a termos mais tecnocratas e a que atribuem
               maior neutralidade, como turbidez, mancha, pluma, rejeitos e sedimentos.

               Nas discussões sobre o rompimento e as suas consequências, as conver-

               30   Veja, por exemplo, Budds e colaboradores (2014).




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