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suem papel relevante na divulgação e na formação de um imaginário
                    acerca da ideia de que é importante a sua aceitação por parte dos mora-
                    dores da vila e da região, conforme apresentado e discutido no capítulo 4.
                    A conjugação desenvolvimentismo-ambientalização também se deu em
                    Regência Augusta, o que se exemplifica pela inclusão de medida colocada
                    à empresa Samarco no polêmico acordo assinado entre os governos do ES
                    e de MG, demais órgãos governamentais e a empresa ré e suas parceiras,
                    Vale S.A. e BHP Billiton. Entre outras medidas de “compensação” do cri-
                    me-desastre causado pela barragem em Minas Gerais, tal medida previu
                    o apoio da empresa na criação da sede de uma UC na foz do rio Doce.
                    Provavelmente será uma APA, e não mais uma reserva de desenvolvimen-
                    to sustentável (RDS), como havia sido proposto inicialmente em 2002 —
                    como analisado no capítulo 5.

                    Regência Augusta, comparativamente à Barra do Riacho, recebe mais
                    atenção do processo de ambientalização, considerando-se a sua porção
                    territorial mais próxima do oceano, e isso também se refletiu na atenção
                    especial dada à foz do rio Doce, quando da chegada dos rejeitos de mi-
                    neração na costa do Espírito Santo — e um pouco a respeito disso pode
                    ser lido no capítulo 10. A forte relação dos moradores de Regência com
                    as águas doces e salgadas também se expressa na importância que os pei-
                    xes tinham (e ainda têm) na alimentação de seus habitantes. Assim, são
                    muitas as incertezas trazidas pela lama da Samarco no que diz respeito aos
                    possíveis efeitos que a ingestão de peixes pode causar na saúde humana
                    ao longo do tempo, incertezas que passaram, então, a compor a relação
                    com os peixes e as relações entre os próprios humanos que eram (e são)
                    estabelecidas por trocas de peixes. Trocas estas que se davam tanto com
                    a mediação do dinheiro quanto sem essa mediação. A nova relação ins-
                    taurada com o alimento-peixe fez também com que, nas falas dos inter-
                    locutores de campo, emergissem as preocupações com as condições das
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                    águas, e, retomando aqui Lévi-Strauss,  os animais são realmente muito
                    bons para pensar e engendram relações muito mais amplas do que aque-
                    las entre humanos e animais não-humanos, como, no caso aqui, as águas.
                    Um retrospecto sobre isso pode ser acessado no capítulo 7.
                    Como já foi sinalizado, as duas comunidades mais ao interior próximas

                    9   Em especial, veja Levi-Strauss (1975) e, como boa leitura de apoio, Sztutman (2009).




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