Page 4 - Revista - Rio e Mar
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Programa de Extensão, a atuação ampliou-se, pois, além No Brasil, e também no Espírito Santo, a política de cria-
de pescadores e pescadoras, encontramos outros grupos ção de unidades de conservação ganhou mais relevo a par-
igualmente atingidos pela expansão de grandes projetos tir da década de 1980. Mesmo quando ela tenta incluir e
industriais e/ou pelas ações governamentais em prol da resguardar o direito territorial dos chamados povos e co-
criação de áreas protegidas (unidades de conservação munidades tradicionais, como no caso das reservas extrati-
de proteção integral e de uso sustentável), as “reservas”, vistas e as reservas de desenvolvimento sustentável, ambas
como são muitas vezes chamadas localmente. Assim, a categorias de uso sustentável, acaba impondo restrições
proposta do projeto deu visibilidade a todos os atingidos por meio de planos de manejo, os quais alteram as relações
e suas histórias de luta, evidenciados nesta publicação. com esses espaços e os seres que nele habitam. Da mesma
forma, a depender de como foram pensadas, criadas e im-
Também tivemos que discutir um problema que afetou
plementadas, podem restringir o peso e a infl uência dos
a todos, embora de variadas formas: o crime-desastre
moradores nas decisões relativas à gestão dos territórios
provocado pelo rompimento da barragem de rejeitos de
que se tornarão (ou já se tornaram) unidades de conserva-
mineração da Samarco S.A., Vale S.A. e BHP Billiton em
ção. As UC’s federais criadas entre 2010 e 2018 no Espírito
Mariana (MG), em novembro de 2015, responsável pela
Santo foram UC’s costeiras/marinhas, demonstrando ain-
dispersão dos rejeitos de mineração pela bacia do Rio
da a tendência atual do conservacionismo nacional e in-
Doce, que chegaram à sua foz e depois se espalharam
ternacional de se preocupar com os ambientes marinhos.
pelo oceano. O crime-desastre atingiu várias comunida-
des, como as comunidades de pescadores e ribeirinhos, Ao mesmo tempo, a região estudada tem sido alvo de
além de outros municípios e localidades, comprometen- pressões pela implantação de grandes empreendimentos
do vidas humanas e não-humanas. Entre as comunida- desde a década de 1970, dentre os quais se destacam: pro-
des de pescadores e ribeirinhos atingidas, estão Barra do dução de celulose, exploração de petróleo e gás, indústria
Riacho e Regência Augusta. química e petroquímica, assim como infraestrutura para
escoamento da produção. Essas atividades, concentradas
No quesito de políticas ambientais, a região estudada
na faixa costeira do Espírito Santo, promovem transfor-
abriga importantes destaques: (a) uma parte da extensão
mações socioambientais e afetam os modos de vida de
do rio Doce, afetado pela lama da Samarco, que, vindo de
grupos que se organizam a partir de uma economia de
Minas Gerais, percorre o estado do Espírito Santo, desde
pequena escala, comumente de base extrativa e familiar.
o extremo norte de Linhares, até chegar à sua foz, em Re-
Como exemplos, podemos citar as lutas de povos indíge-
gência Augusta; (b) a Área de Proteção Ambiental Costa
nas Tupinikim e Guarani, de quilombolas e de pequenos
das Algas e o Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz, no
agricultores contra os avanços dos eucaliptais, aos quais
município de Aracruz; (c) a Reserva Biológica de Com-
se associam alterações hídricas e climáticas. Além disso,
boios, no município de Linhares. Essa região é banhada
lembramos das demandas de ribeirinhos e pescadores,
a leste pelo oceano Atlântico e se encontra descrita como
historicamente habitantes dessa região, que sofrem com
uma das áreas prioritárias para a conservação da biodi-
o avanço desses empreendimentos em seus lugares de
versidade costeira e marinha do Brasil, por conta da pre-
vida e trabalho.
sença de um grande banco de algas calcárias e corais.
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