Page 60 - Na Teia - Mauro Victor V. de Brito
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dizimadas à época, porque para o momento não era interessante
registrar. O que interessava era demarcar o inimigo a ser comba-
tido e “limpar” a cidade da “peste-gay”.
O processo higienista mostra sua face trinta anos depois com os
herdeiros da Tarântula e as violências trazem à tona o fantasma
da ditadura, mas dessa vez a limpeza se transveste e passa a ter
um interesse econômico e político. O que, por sua vez, se utiliza
de artefatos já conhecidos para produzir a mesma racionalidade
na sociedade civil, que criminaliza a população T, mas, citando
Neon Cunha, os rastros de sangue dos anos 1980 produziram
pessoas e ideias fortes, ideias de resistência para garantir a exis-
tência e a inserção de quem foi jogado à margem.
A sociedade moderna experimenta, no início do ano de 2020,
uma das maiores tragédias da história: a pandemia do COVID-19.
Ela não escolhe gênero ou sexualidade e transforma a realidade
de todos ao redor do mundo; mas como fica a realidade daquelas
que já têm uma existência diferente da maioria?
Em São Paulo, a recém-inaugurada Casa Arouchianos reúne
mais de 200 cestas básicas para distribuir para a população travesti
e transexual do centro da cidade. Antes de retirar as cestas, todos
recebem instruções e equipamentos para se prevenir contra o Novo
Coronavírus. O isolamento social some com os clientes de prosti-
tutas que se veem sem a sua única forma de subsistir, mas a nova
onda, cunhada numa geração de movimentos sociais que rediscu-
tem gêneros e sexualidades no mundo moderno, produz uma teia
forte e articulada, que vai tratar de auxiliar e cuidar para garan-
tir o mínimo a essa população.
Essa mesma teia que se articula para enfrentar o conservado-
rismo, também pressiona para a criação de novas políticas públicas,
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