Page 296 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
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Foi ao enterrar sua família vítima da epidemia que se esparramava por toda
a região da sua cidade natal, que Cesar se fez vulnerável à insanidade que um
dia iria se apossar da sua consciência e da sua alma, lenta, mas
inexoravelmente.
“_Afinal o que mais poderia fazer?”
Como responder de forma minimamente coerente ao fantasma de si mesmo
que escarnecia do seu sofrimento por amar uma família que sempre estivera
ao alcance do seu amor e mais do que isso, ansiando por esse amor, e que ele
não se dignara aceitar como humana e, consequentemente, cheia de defeitos?
Como encarar o espelho que refletia uma face em que as lágrimas borraram as
linhas até transformá-la numa espécie de máscara em que apareciam
marcadas as provas de cada uma das suas falhas como ser humano
monstruosamente egoísta, e que se ia enfeiando mais e mais com os sucessivos
pecados e crueldades e julgamentos, num arremedo pobre do castigo
idealizado por Oscar Wilde ao seu famoso personagem? Como responder ao
rictus cruel do fantasma espantalho no espelho, que repetia sempre a mesma
pergunta como uma infindável ladainha?
“_Mas afinal o que você esperava?”
Incorporou-se da sua tragédia.
Ao mesmo tempo, conscientemente abdicou completamente do amor em
todas as suas formas. Compreendeu que era o que lhe restava porque toda sua
tolice em julgar sua família ao invés de tentar apenas amá-la o havia feito um
não merecedor do amor. E não pela fatalidade do desencanto que o alcançava,
como se acostumara a pensar, mas por ser deixado pelo amor muito antes de
se reconhecer desiludido.
Muito antes de se perceber esvaziado da paixão, nos primeiros vislumbres da
possibilidade de um amor mais profundo e verdadeiro e generoso, Cesar se