Page 306 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
P. 306
E no entorno, tudo absolutamente igual, impossível de se identificar qualquer
particularidade a diferenciar uma trilha de outra, um descampado de outro,
quilômetros e mais quilômetros das mesmas cores, mesma brisa, mesmos
cheiros, mesma terra árida, mesma vegetação rasteira e áspera, como uma
armadilha que ia puxando Cesar para um redemoinho de paisagens
infinitamente copiadas e reproduzidas e repetidas aos olhos do viajante para
transtornar sua direção e fazê-lo se perder num labirinto sem paredes, a céu
aberto. Uma prisão sem grades.
Mas Cesar, por absoluta impossibilidade de voltar ao antigo tormento, estava
decidido a seguir um caminho na sua maior parte intuitivo que refletia a busca
interna da sua consciência por sua alma, e a recompensa veio silenciosa e tão
gradual que não foi notada imediatamente.
Na forma do lento incorporar da caminhada, aos poucos, delicadamente, um
saber intrínseco começou a se impor e Cesar sorveu-o e foi adquirindo uma
espécie de compreensão da senda de peregrinação.
Abandonou as lutas e as exigências por facilidades impossíveis e as revoltas
infantis contra as pedras e tocos e curvas e as pequenas depressões que antes
o faziam claudicar e perder o equilíbrio e cair. Começou a entender o passo a
passo e se rendeu ao fluir dos movimentos da caminhada e, pouco a pouco,
seguir adiante foi ficando fácil e natural até ser verdadeiramente prazeroso
caminhar a favor da brisa.
Devagar, mansamente, Cesar deixou de lutar e se entregou e a natureza o
abraçou reconhecendo-o como a um filho pródigo.
Mas alcançar esse entendimento levou um tempo inimaginado e insuspeito
para o jovem antes impetuoso e mimado. Até ele conseguir se reconhecer o
suficiente e começar a sentir o próprio corpo e se respeitar e se adaptar aos
movimentos que combinariam com as nuances do seu caminhar, ao se
reconhecer um buscador de si mesmo e da própria consciência Cesar contava
trinta e cinco anos.