Page 310 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
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sobre o cobre daquelas terras transformou o pequeno lago num espelho d’água
completamente dourado e tão incrivelmente cristalino que por instantes a
imagem refletida fez céus e terra se unirem e se prolongarem um no outro e os
milhões de estrelas da madrugada se esparramarem pela água e pelo solo do
deserto como se ali se houvesse estendido, desde lá de cima, um manto de
diamantes. E por um segundo Cesar prendeu a respiração, fulminado pela
beleza daquela ilusão.
E mesmo acreditando não ter feito nenhum movimento ou o mínimo rumor,
a verdade é que deve ter deixado escapar, ainda que apenas um suspiro de
encantamento diante de tamanha magia, porque o velho indígena que
meditava ao seu lado se mexeu do seu poder extraordinário de transcendência
e abriu os olhos, voltando-se para fita-lo tranquilamente.
O rosto, com traços severos e pele escura, sumiu da percepção de Cesar,
ofuscado pelos raios do sol surgindo detrás da figura do índio. E de repente se
apagaram as estrelas e se desintegraram os véus dos sonhos para eles se
envolverem, e à vida, numa capa reverberante de luz e calor.
Com um leve aceno de cabeça para desviar sua atenção de Cesar e ainda em
silêncio, o índio ergueu os olhos para o infinito, para ir se incorporando com
vagar, recitando mentalmente uma prece do amanhecer. Sentindo novamente
sua alma se limitando pelo invólucro físico e reorganizando os sentidos para
reassumir aquela maneira usual, no estado de vigília comum, de estar no
mundo.
Depois se ergueu sem pressa, com cuidado e delicadeza fez um movimento
simples, quase imperceptível, de cumprimento ao sol que já se impunha
completamente soberano no dia do deserto, lançando seus raios desde a linha
do horizonte.
Convidou. “__Venha Cesar. Vamos comer.”