Page 352 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
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Para Cesar, esse assunto, todo misticismo envolvido, as sensações que o
esmagavam durante os sonhos em que invariavelmente caia no precipício sem
fim, envolvido pelo som ecoante do grasnar do Condor com notas
profundamente tristes e vibrantes que lhe devassavam a alma, começou a ser
uma obsessão.
Rapidamente se extinguia qualquer mínima possibilidade dele recuperar a sua
paz. Já não conseguia se concentrar em mais nada.
Começou a escrever textos após textos em que a situação mágica se
desenrolava e a cada vez o final era mais trágico, mais terrivelmente triste e
definitivamente cruel.
Ouvia o grito da ave de rapina, sentia sobre a face seu hálito quente, era
envolvido pelo farfalhar e pelas asas enormes, agitadas que lhe batiam
incansavelmente no rosto.
Reproduzia sem parar as notas do grito ecoante como se o estivesse escrevendo
sobre uma escala musical. Com pequenas alterações a cada nova escrita,
alguma pequena coisa aqui e ali. Fazia-o mais estridente, ora mais grave, ou
mais insuportavelmente longo, sem fim, fiel a sua agonia.
Uma agonia que acabava sempre com seu corpo se despedaçando no fundo
rochoso e escuro do abismo. Sempre e sempre, numa repetição infinita e
angustiante a renovar o pavor, o medo e a perda da sua vida.
E Cesar reconheceu que esse fim do qual não conseguia fugir, acontecia
inevitavelmente pela simples, cruel e inequívoca razão de haverem cortado
suas asas.
Isabeau jamais saberia, mas sua decisão de ir ficar algum tempo morando com
seu tio avô, Cesar Ninan, em Roma, contribuiu para a síncope que vinha se
formando nele. Em seu espírito perturbado.