Page 32 - Leandro Rei da Helíria
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BOBO: Batem-te muito?
PASTOR: Bater? No meu reino ninguém bate em ninguém!
BOBO: Ninguém?!
PASTOR: Ninguém. No meu reino não há escravos. No meu reino somos todos homens livres.
BOBO: O que é isso?
PASTOR: Isso o quê?
BOBO: Um homem livre.
PASTOR: Ora, sei lá... A minha Briolanja, se aqui estivesse, é que seria capaz de te explicar. Ela é
que sabe usar bem as palavras. Às vezes até sabe bem de mais, e leva-me na cantiga... Ah! Ah!...
Homem livre... é assim... assim como nos sonhos que a gente às vezes tem, sabes?, poder andar por
toda a parte, dizer o que está dentro da nossa cabeça...
REI: Em toda a parte há morte, ambição, loucura...
BOBO: E se o que está dentro da tua cabeça não for igual ao que está dentro da cabeça do teu
senhor — não te amarram ao pelourinho para te chibatarem?
PASTOR: Nem sei o que é um pelourinho!... Nunca vi nenhum no meu reino. E chibata, nem para os
animais! Nem mesmo quando eles são teimosos e casmurros!
BOBO: São felizes as pessoas no teu reino?
PASTOR: Para uns a vida é mais dura que para outros, mas não falta trabalho para quem não for
madraço, e os velhos passam aos novos a sabedoria antiga das coisas.
BOBO: E tu, vives bem?
PASTOR: Quando chego a casa à noite, depois de recolhidas as ovelhas, a minha Briolanja tem
sempre o caldo ao lume, e a cozinha cheira que é um regalo!
REI: Em toda a parte há medo, conspirações, intrigas...
BOBO: Haverá por lá lugar para mais dois?
PASTOR: Nunca de lá vi ninguém ser expulso..
BOBO: Está-me a cheirar a fartura de mais...
PASTOR: Nada melhor do que ires lá ver pelos teus próprios olhos.
REI: Em toda a parte há fome, traições, vinganças...
BOBO: É difícil encontrar o caminho para o teu reino?
PASTOR: Nada mais simples: sais desta gruta e tomas o caminho que leva à encruzilhada dos
álamos. Viras-te para sul, e tomas a estrada que fica por detrás da fonte. Contas dez passos para