Page 30 - Leandro Rei da Helíria
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BOBO: Foi nome que nunca mais pude pronunciar diante dele. (Aponta para o rei)

                  PASTOR:  Não  há  dúvida  de  que  o  velhote  é  de  ressentimentos...  Eu  cá,  já  me  têm  feito muitas
                  desfeitas, mas assim como vêm, assim vão, já nem me lembro delas!

                  BOBO: Mas tu não és rei.


                  PASTOR: Ser rei é assim tão diferente?

                  BOBO: Quando se tem a coroa na cabeça, é.

                  PASTOR: E nunca pensaste em ir por aí fora, à procura da outra?

                  BOBO: Qual outra?!

                  PASTOR: Ai!... A do sal!


                  BOBO: Para quê? Com muito mais razão nos fecharia as portas do seu reino. Pois não a expulsou
                  ele um dia de casa? Pois não disse ele que, a partir dessa altura, era corno se ela nunca tivesse
                  nascido?

                  PASTOR: Ora... Coisas que se dizem... Eu cá, se fosse a ti, tentava.

                  BOBO: Ele matava-me! E eu posso ser bobo, mas não sou maluco! Quem fez este corpinho já não
                  faz outro!

                  PASTOR: Ele não saberia de nada... Está cego... És tu que o conduzes...


                  BOBO: Ele está cego e tu estás doido! Sei lá por onde anda Violeta! Já tantos anos se passaram...
                  Se a visse, de certeza que já nem a reconhecia. O que eu queria agora, mais que tudo, era poder
                  encontrar um lugar para assentarmos de vez. O velho tem os pés em sangue, parece um farrapo,
                  receio que não aguente nova caminhada.

                  PASTOR: Havias de gostar do meu reino...

                  REI (desperta): Em toda a parte há dor, ingratidão, miséria...

                  (Juntam-se os três no meio da gruta para se aquecerem à roda da fogueira)


                  PASTOR (muito baixinho): Havias de gostar do meu reino...

                  (Apagam-se as luzes)


                                                           Cena V
                                                  Reginaldo, Violeta, Pastor
                                               (No palácio de Violeta e Reginaldo)

                  PASTOR:  E  ele,  senhora!  Podeis  acreditar  nas  minhas  palavras.  Tão  certo  como  eu  me chamar
                  Godofredo Segismundo!

                  VIOLETA: Mas como podes estar assim tão certo se nem sequer o conheces?
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