Page 34 - Leandro Rei da Helíria
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VIOLETA: Vou imediatamente dar as minhas ordens na cozinha. E tu... (Vira-se para o pastor)

                  PASTOR: Godofredo Segismundo, às vossas ordens.


                  VIOLETA: Tu, Godofredo Segismundo, vai avisar toda a gente que esta noite as portas do palácio
                  estão abertas, e haverá comida para todos. E depois fica de vigia à entrada do reino, e assim que o
                  rei aparecer traz-mo logo à minha presença. Mas atenção...

                  PASTOR: Já sei, já sei (imita-lhe a voz) ... «sem lhe revelar a vossa identidade».



                                                          Cena VIII
                                                      Bobo, Rei Leandro
                                                      (Às portas do reino)

                  BOBO  (estafado):  Dez  passos  para  poente...  última  árvore  do  bosque...  montanha...  o vale...
                  Chegámos! Chegámos!


                  REI: Não entendo a tua alegria... Estamos sempre a chegar e sempre a partir. Desta vez chegámos
                  onde?


                  BOBO: Ao reino do pastor que encontrámos na gruta. Não te lembras, senhor, como ele disse que a
                  vida era boa, farta, tranquila?

                  REI: Em toda a parte há medo, miséria, tristeza...

                  BOBO: Ai, meu senhor,  por amor  de Deus não comeces outra vez com  essa lengalenga! Desde
                  aquela noite na gruta que não te oiço outra coisa! Não me digas que também foi algum segredo dos

                  deuses... Desculparás que te diga, mas os segredos dos deuses só te têm trazido aborrecimentos.
                  Melhor seria que eles não se tivessem lembrado de ti. De resto, sempre ouvi dizer que isso de ter
                  segredinhos com uma pessoa era coisa muito feia!

                  REI: Tanto falas e tão pouco dizes, meu pobre tonto...

                  BOBO (batendo às portas do reino): Posso ser tonto mas consegui trazer-te a bom porto! Isto por
                  aqui parece-me terra de jeito.


                  REI: Tivesse eu os meus olhos, e saberia o que me espera para lá destes muros. Os meus olhos
                  nunca  me  enganaram.  Bastava  pousá-los  sobre  uma  pessoa,  para  logo  saber se  ela  era  leal  ou
                  traiçoeira, se as suas palavras eram verdadeiras ou escondiam os ecos da intriga.

                  BOBO: Bom... Alturas houve em que os teus olhos bem te enganaram, senhor, mas não vamos falar
                  de coisas tristes e já passadas. Agora só quero encontrar guarida e dormir horas, horas e horas! Ah,
                  que saudades eu tenho de uma cama verdadeira. Ainda te lembras como era uma cama a sério?

                  REI (recordando): Era macia...

                  BOBO: O corpo afundava-se nela...


                  REI: ... tinha o cheiro do feno...
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