Page 174 - As Viagens de Gulliver
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atenção, formando a partir daí uma melhor opinião sobre mim. Pediu-me para,
      dentro  das  minhas  possibilidades,  fazer  uma  descrição  exata  do  governo  em
      Inglaterra,  pois,  tão  limitados  que  os  príncipes  normalmente  estejam  aos  seus
      costumes próprios (assim deduzia ele de tudo o que lhe contara sobre os outros
      monarcas), ele gostaria, no entanto, de ouvir qualquer coisa que merecesse ser
      imitada.
















          Imagina-te  no  meu  lugar,  caro  leitor,  e  pensa  quão  fortemente  eu  não
      desejei, nesse momento, dispor da capacidade retórica de um Demóstenes ou de
      um  Cícero,  que  me  permitisse  glorificar  o  meu  querido  país  natal,  num  estilo
      digno dos seus méritos e prosperidade.
          Comecei  por  informar  Sua  Majestade  de  que  os  nossos  domínios  se
      compõem de duas ilhas, constituindo três poderosos reinos sob o governo de um
      só soberano, além das nossas colônias na América. Alonguei-me bastante sobre a
      fertilidade do nosso solo e a temperatura do nosso clima. Referi-me, depois, por
      alto, à constituição do Parlamento inglês, em parte composto por um ilustre corpo
      designado pela Câmara dos Pares, pessoas do mais nobre sangue e com maiores
      e  mais  antigos  patrimónios.  Descrevi  o  primor  extraordinário  com  que  eram
      sempre educados nas artes e nas armas, habilitando-os a desempenhar o cargo
      de conselheiros, para o qual tinham nascido, destinados a servir o rei e o reino; a
      tomarem parte ativa na legislação; a serem membros do Supremo Tribunal da
      Justiça, para além do qual não há apelo possível; e a serem aqueles campeões
      sempre  prontos  a  correr  em  defesa  do  seu  príncipe  e  do  seu  país,  com  o  seu
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