Page 327 - As Viagens de Gulliver
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ocupados; que, para aí fazer praticar as leis do cristianismo, temos o cuidado de
mandar pastores muito piedosos e muito edificantes, homens de bons costumes e
de bom exemplo, mulheres e donzelas irrepreensíveis e de uma virtude bem
demonstrada, valentes oficiais, juízes íntegros e, principalmente, governadores de
uma reconhecida probidade, que fazem consistir a sua felicidade na dos
habitantes do país, que não exercem tirania alguma, que não têm avareza,
ambição, cupidez, mas unicamente muito zelo pela glória e pelos interesses do rei
seu amo.
De resto, que interesse teríamos nós em querer nos apoderar dos países
cuja descrição fiz? Que vantagens tiraríamos do trabalho de acorrentar e matar
os naturais? Nesses países não há minas de ouro ou de prata, nem açúcar, nem
tabaco.
Se, no entanto, a corte for de parecer contrário, declaro que estou pronto a
atestar, quando me interrogarem judicialmente, que, antes de mim, europeu
algum pusera os pés nestas mesmas regiões; tomo por testemunhas os naturais,
cujo depoimento deve fazer fé. É verdade que se pode fazer chicana com
relação a esses dois Yahus que citei, e que, conforme à tradição dos huyhnhnms,
apareceram sobre uma montanha e tornaram-se desde então a vergôntea de
todos os Yahus que infestam essa região. Não é difícil, porém, provar que esses
dois antigos Yahus eram oriundos da Inglaterra; certos traços dos seus
descendentes, certas tendências, certas maneiras o fazem pressupor. Quanto ao
mais, deixo aos doutores em matérias de colônias discutir este assunto e
examinar se não se funda num título claro e incontestável pelo direito da Grã-
Bretanha.