Page 281 - Fernando Pessoa
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FERNANDO  PESSOA

                      sou  rapidamente.  Sucedeu-se  um sentimento  difícil  de  defi-
                      nir, mas em que se salientavam incomodamente as sensações
                      de tédio, de humilhação e de fadiga.

                           De tédio, como se o Destino me houvesse imposto uma
                      tarefa em serões desconhecidos.  De tédio, como se um novo
                      dever — o de uma horrorosa reciprocidade — me fosse dado
                      com  a  ironia  de  um  privilégio,  que  eu  me  teria  ainda  que
                      maçar, agradecendo-o ao Destino. De tédio, como se me não
                      bastasse a monotonia inconsistente da vida, para agora se lhe
                      sobrepor  a  monotonia  obrigatória  de  um  sentimento  defi-
                      nido.


                           E de humilhação, sim,  de humilhação.  Tardei em  per-
                      ceber  que  vinha  um  sentimento  aparentemente  tão  pouco
                       justificado  pela  sua causa.  O  amor a  ser  amado  deveria  ter-
                       me aparecido. Deveria ter-me envaidecido de alguém reparar
                      atentamente para a minha existência como ser amável. Mas,
                       à  parte o  breve  momento  de  real  envaidecimento,  em  que
                       todavia  não  sei  se  o  pasmo  teve  mais  parte  que  a  própria
                      vaidade,  a  humilhação  foi  a  sensação  que  recebi  de  mim.
                       Senti  que  me  era  dada  uma  espécie  de  prêmio  destinado  a
                      outrem — prêmio, sim, de valia para quem naturalmente o
                       merecesse.


                           Mas fadiga, sobretudo fadiga — a fadiga que passa o té-
                       dio. Compreendi então uma frase de Chateaubriand que sem-
                       pre  me  enganara  por  falta  de  experiência  de  mim  mesmo.
                       Diz  Chateaubriand,  figurando-se  em  René,  "amarem-no
                       cansava-o"  —  on  le fatiguait  en  Vaimant.  Conheci,  com
                       pasmo, que isto representava uma experiência idêntica à mi-
                       nha, e cuja verdade portanto eu não tinha o direito de negar.


                           A fadiga de ser amado, de ser amado deveras!  A  fadiga
                       de sermos o objeto do fardo das emoções alheias!  Converter
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