Page 84 - O Que Faz o Brasil Brasil
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sociais. Pois bem, o humilde cidadão chega e pede o que deseja...
2 Ato: O funcionário custa a atender a solicitação. Diz que
o
não pode ser assim e ainda complica mais as coisas, indicando as
confusões do solicitante e as penalidades legais a que poderá estar
sujeito. Cria-se, então, um impasse. Diante de um usuário honesto, há
a opinião do funcionário que representa a lei e, por isso mesmo, não
enxerga qualquer razão pessoal ou humana para tratar o
solicitante de modo agradável. De fato, a lei, e o fato de ele ser o
seu representante, cega-o completamente para essas razões
humanitárias que decerto estabeleceriam e seriam parte e parcela
de uma concepção de cidadania positiva, isto é, uma cidadania
na qual os indivíduos têm os seus direitos assegurados e respeitados
em todas as situações. Nessa situação, o solicitante não é nada. Ê
apenas um indivíduo qualquer que, como um número, um caso
complicado, um estorvo ou um requerimento, solicita algo. Temos
aqui um alguém que é ninguém. Ele, obviamente, representa o
humano e o pessoal numa situação impessoal e geral...
3 Ato: Diante do impasse — pois o funcionário diz que não
o
pode e o cidadão deseja resolver o seu caso —, há a solução que
denuncia e ajuda a ver o mapa de navegação social. Nos países
igualitários, não há muita discussão: ou se pode fazer ou não se pode.
No Brasil, porém, entre o “pode” e o “não pode”, encontramos um
“jeito”. Na forma clássica do “jeitinho”, solicita-se precisamente isso:
um jeitinho que possa conciliar todos os interesses, criando uma
relação aceitável entre o solicitante, o funcionário-autoridade e a lei
universal. Geralmente, isso se dá quando as motivações profundas
de ambas as partes são conhecidas; ou imediatamente, quando
ambos descobrem um elo em comum. Tal elo pode ser banal (torcer
pelo mesmo time) ou especial (um amigo comum, ou uma
instituição pela qual ambos passaram ou, ainda, o fato de se ter
nascido na mesma cidade...). A verdade é que a invocação da
relação pessoal, da regionalidade, do gosto, da religião e de outros