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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização

               atuação desses órgãos se resume à preocupação com a biodiversidade. E,
               perante a atual situação, com os impactos sociais e ambientais pós-rompi-
               mento da barragem da Samarco, aumentam os questionamentos sobre a
               falta de importância da comunidade nos processos decisórios. Além dis-
               so, há uma insatisfação relacionada à injustiça das escalas de fiscalização
               e influência dos órgãos ambientais e do Poder Judiciário, a qual é expres-
               sa na fala de uma pescadora de Povoação, outra comunidade situada na
               margem esquerda da foz do Rio Doce:

                       Eu falo, eu vejo, [...] que o poder aquisitivo fala mais alto que o
                       poder de ser, ser humano. Talvez, se nós tivéssemos matado uma
                       caça, talvez se nós tivéssemos desmatado a reserva ou tirado o gu-
                       riri  da beira da praia, talvez nós estaríamos tudo atrás da cadeia,
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                       mas eles têm poder. [Entrevista realizada pela equipe do Grupo
                       de Estudos e Pesquisas em Pesca e Desenvolvimento no Espírito
                       Santo (GEPPEDES) em Povoação, em setembro de 2016].



               À GUISA DE CONCLUSãO

                  Aparentemente, os conflitos relacionados acima não parecem se res-
               tringir à região das comunidades da foz do Rio Doce, pois, de uma ma-
               neira geral, no próprio processo de criação do SNUC, fica evidente que
               existem composições de forças ideológicas que influenciaram os deba-
               tes de criação desse sistema e que interferem nas diversas instâncias dos
               órgãos ambientais e nas políticas públicas relacionadas ao ambiente.
               Na literatura, geralmente são destacadas divergências de posições entre:
               os preservacionistas, que no atual modelo tendem a defender a criação
               de unidades de proteção integral, as quais têm o objetivo de preservar a
               natureza, com os seus recursos sendo usados somente de forma indireta
               como, por exemplo, em pesquisas; e os conservacionistas e socioambien-
               talistas, que propõem um modelo de reserva onde haja coabitação entre
               as comunidades tradicionais de uma determinada região e o uso regulado
               e sustentável dos recursos naturais, conciliando desenvolvimento huma-
               no com proteção da natureza.



               11   Palmeira Allagoptera arenaria, natural da restinga e conhecida popularmente como Gu-
               riri, Purunã, Paissandu, Coco da Praia, Caxandó.




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