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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização

               (LEONARDO et al., 2017), 99% dos moradores entrevistados relataram
               mudanças em suas rotinas após a lama e, entre os fatores apresentados,
               estão: aumento dos gastos com alimentação, prejuízos na pesca, falta de
               lazer e aumento dos gastos com água.
               Foco da atenção de surfistas de diversos lugares do Brasil, as ondas de Re-
               gência são comparadas com ondas havaianas e até com as da Indonésia, e
               a contaminação trazida pela lama pôs em risco o seu uso, e alguns dizem
               que a sua conformação também. A falta de divulgação de laudos gera in-
               trigas entre os moradores, entre eles os surfistas, que apontam para a falta
               desses laudos e de uma resposta assertiva sobre as condições das águas.
               Sendo assim, encaram as ondas sem saber o risco que correm. Tratando-
               se da saúde dessas pessoas que ainda têm contato com as águas do Rio
               Doce ou do mar em Regência, não se sabe ainda se altas doses gradativas
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               desses metais (arsênio, bário, chumbo, cobre, mercúrio e níquel ) serão
               prejudiciais ao organismo através do contato com a pele, por exemplo.
               Após a lama, a dinâmica da Vila de Regência foi alterada por diversos
               conflitos entre os moradores atingidos, porém, antes da lama atingir a
               foz do rio Doce, Regência já passava por conflitos devido aos anúncios
               de grandes empreendimentos que geraram muitas alterações nas dinâ-
               micas da vida local em associação com conflitos com outros agentes. Ou
               seja, o evento da lama desencadeou e amplificou conflitos já existentes,
               os quais ganharam novas ressignificações. Esse caso é bem semelhante
               ao que ocorreu nas comunidades afetadas pelas construções das barra-
               gens de Sobradinho e Machadinho, conforme descrito pela autora Lygia
               Sigaud (1988) no texto intitulado “Efeitos Sociais de Grandes Projetos Hi-
               drelétricos: As Barragens de Sobradinho e Machadinho”. O referido texto
               teve como objetivo mostrar um estudo comparativo dos efeitos sociais,
               políticos, econômicos e culturais para os “atingidos”, considerando ainda
               que houve a intervenção do Estado na construção de hidrelétricas. Junto
               às populações analisadas, os conflitos culminaram em novas reestrutura-
               ções sociais, algumas das quais semelhantes às encontradas em Regência,
               como novas formas de readequação social, política e econômica. Conse-
               quentemente, nesse novo cenário, a identidade e as relações sociais ga-

               2   Os metais encontrados constam no laudo divulgado pelo Serviço Autônomo de Água e
               Esgoto (SAAE) de Baixo Guandu em novembro de 2015. Fonte: http://www.pmbg.es.gov.
               br/v1/ (último acesso em: 05/03/2018).




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