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Capítulo 8

                    divulgação e de informações como algo que trazia dificuldades para a rea-
                    lização de campeonatos, pois havia empecilhos para se conseguir um pa-
                    trocínio para um evento de grande porte após o rompimento da barragem.
                    Algo interessante é que os surfistas foram um dos agentes de resistência
                    que protestaram contra a Samarco logo na chegada da lama em Regência.
                    Em diálogos com ela, tentaram reivindicar e colocar-se como atingidos,
                    mas não foram escutados pela empresa e seus consultores. É importante
                    ressaltar que a empresa possui um “perfil” de atingido que não abrange
                    todos que tinham algum tipo de vínculo com o Rio Doce. Leonardo e co-
                    laboradores (2016) reiteraram:

                           Sendo assim, reconhecer-se e fazer-se reconhecer enquanto atin-
                           gido tem sido um processo doloroso para todas as pessoas que
                           viviam ou que, de alguma outra forma, estabeleciam uma relação
                           de trabalho, religiosa, afetiva ou de outro tipo com o Rio Doce.
                           Dessa forma, entendemos que a necessidade de ter que se enqua-
                           drar em um perfil de atingido, delimitado pela própria empresa,
                           tem ampliado o sofrimento social das vítimas do desastre na foz
                           do Rio Doce (LEONARDO et al., 2016, p. 101-102).

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                    Os surfistas que também são comerciantes  — pois há diferentes tipos de
                    surfistas — relataram o quanto foi desgastante, no início, encaixarem-se
                    nesse “perfil” apresentado pela empresa, fazendo com que muitos deles
                    fossem embora para outros lugares. O surfista Ricardo, em uma entrevista
                    de 30 de maio de 2016, seis meses após a chegada da lama em Regência,
                    relatou a dificuldade de se adequar ao “perfil” de atingido estabelecido
                    pela Samarco:

                           [...] pra mim eu não tenho condição de, igual eu tô falando, pra
                           gente foi atingido porque a gente vivia do mar, do surfe, turismo,
                           surfe dia, aí com a questão da lama persistindo aqui, com a ques-
                           tão do mar, do peixe suspenso mesmo, e a gente aqui não quer tra-
                           balhar com a questão de festa, de fomento, eu poderia abrir algu-
                           ma coisa voltada à festa noturna... isso aí a gente não se adequou,
                           por enquanto não quer mexer com isso... então surfe, dia, atingiu,

                    7   O comércio em Regência está interligado ao turismo e ao surfe. Nesse caso, há surfistas
                    que são donos de pousadas e restaurantes.




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