Page 10 - Revista - Rio e Mar
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“(...) na época dos meus avós, dos meus pais, isso aqui não era assim, né. Isso aqui era uma comunidade, assim, bem de-
                pendente e autossustentável da pesca, entendeu? Porque esse rio nosso aqui mesmo, esse rio Riacho, antes da constru-
                ção do canal aí Caboclo Bernardo (né, tem as comportas da Fibria que fecham lá, lá em cima no rio Riacho), ele era um
                rio que era totalmente limpo, entendeu? O fundo dele não era essa lama hoje que existe aí, essa lama, mistura de lama
                com esgoto, era aquele barro branco, era batinga, então tinha várias e várias espécies de peixe. Você conseguia pegar aí
                robalo, piaba, manjuba, carapé, siris. Siri tinha muito, então caranguejo. Você levantava a raiz do mangue, balançava e
                botava a peneira embaixo caía camarão da água doce. Então, assim, as pessoas, o pescador não precisava ir longe, aqui
                na beirinha mesmo eles já pegavam o peixe deles e já voltava. Voltava rápido pra casa. Hoje em dia, o rio tá todo poluído.
                O mar tá todo poluído, entendeu? Degradação das indústrias.” (líder comunitário, fev. 2017).
                “Nós estamos passando um problema sério aqui também de desemprego, tá?! Por mais que seja uma... comunidade,
                assim, que tenha muitas empresas hoje, se eu for contar pra você aqui, óh, as grandes, as grandes... óh, Portocel, Fi-
                bria, Evonik, Canexus, já foi quatro, Estaleiro Jurong Aracruz, cinco, Carta Fabril, seis, Nutripetro, sete, Ultragás, oito.
                Já foram oito. Aí tem... deixa eu mais qual... Transpetro, que é TABR Terminal Aquaviário de Barra do Riacho, nove.
                Terminal Imetame, dez. Isso só grandes empresas que eu tô falando, que muitas delas chegam a nível internacional
                (...). Então, assim, essas são as grandes, se você pegar as pequenas que também tem aqui, aí vem Isometal, vem Tecvix,
                vem a... Isocarp, aí vem a Gafor, vem a... Fortmar, a... tem Júlio Simões, tem Andritz, tem... Gramado (...). Várias e várias
                outras. Se você chegar no total dá mais de 20 empresas!” (líder comunitário, fev. 2017, grifos nossos).


            Esses grandes empreendimentos também atingem dire-    evidenciam isso, resultando na violação de direitos e na
            tamente a atividade da pesca, levando os pescadores a se  produção de possíveis consequências para a saúde dos
            deslocarem com seus barcos mais para o norte do estado.  moradores locais. Diz o documento redigido pela Rede
                                                                  Brasileira de Justiça Ambiental (2014): “a poluição não é
            “(...) Agora as outras empresas, tem aquela empresa lá que fez
                                                                  democrática, não atinge a todos da mesma maneira uni-
            o cais lá embaixo, pro navio e prejudicou nós também, sobre a
            pesca [se refere à Jurong]. Quando eles fi zeram ali, nós tínha-  forme e não submete todos os grupos sociais aos mes-
            mos uma área de pescaria, nós raspávamos o camarão, pescá-  mos riscos e incertezas. Igualmente é imposta, por meio
            vamos ali mas aí eles privaram, que a gente não podia pescar  da violência, da desinformação e da desqualifi cação, da
            mais, proibiram pescar e nós paramos de pescar. A Portocel  perda dos territórios e do acesso aos bens naturais como
            também nos prejudicou muito, ali onde era o Porto era uma   condição para expansão do modelo, como garantia de lu-
            área para nós pescar, pescava muito peixe ali, pescadinha, sar-  cratividade do capital.” (FASE, 2014).
            da, espada e ela tomou conta de tudo. Essa área aqui foi toda
            tomada nossa. (...) Era tudo pesqueiro. (...). Acabaram nossas  Algumas denúncias feitas por uma liderança comunitá-
            pedras de mariscar tudinho, muita pedra de mariscar que as  ria do local reforçam essa ideia:
            mulheres mariscavam e até nós mesmos podíamos mariscar,
                                                                  “(...) a comunidade, ela tá numa bomba relógio! Se você olhar
            pegavam um monte de marisco e acabou com tudo.” (pescador,
                                                                  ali no TABR, Terminal Aquaviário, ali tem, ali tem duas esfe-
            77 anos, set. 2017).
                                                                  ras, esfera mesmo! Sabe que é esfera? É uma bola! Não tem
            A injustiça ambiental está muito presente na localidade.  uma bolinha de gude? É isso aí! É uma esfera, só que ela é
            Os relatos que ouvimos e a observação acurada do lugar  enorme, é do tamanho, acho que chega a ser maior que esse


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